NOTA DA SEMANA: A má moeda que foi substituída pela boa Moeda(s)

Foto: PÚBLICO

Depois de mais uma longa noite eleitoral, neste caso para as autarquias, os Portugueses necessitaram de muita paciência para conseguirem perceber quem realmente venceu as eleições.

Confesso, que tem sido cada vez mais complexo entender como é que em plena Democracia existem tantos Partidos vencedores, mas poucos são os derrotados.

É daquelas coisas que, com o passar dos tempos e a suposta maturidade do nosso regime, cada vez mais se complica e adensa em cada ato eleitoral que se realiza, quando deveria ser o contrário.

Contudo, não posso deixar de dizer que estas últimas eleições autárquicas foram subjugadas pelas estratégias nacionais dos dois grandes Partidos Políticos em Portugal, neste caso o Partido Socialista (PS) e o Partido Social Democrata (PSD).

Aquilo que se desejava que fosse uma eleição local, acabou por ser “contaminada” pela dinâmica nacional, o que, em minha opinião, não abona em favor da separação entre Poder Local e Poder Central, especialmente num momento em que se recorre ao discurso da descentralização de competências como hipotética salvação para o País.
Razão pela qual foram incluídos diversos temas, como o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), numa discussão que, em muitos casos, pretendia mais satisfazer a agenda mediática nacional e menos as preocupações locais.

No entanto, importa, factualmente, dizer que os vencedores foram, em primeiro lugar, cada um dos candidatos que, localmente, foi eleito para presidir aos diferentes órgãos autárquicos e só depois os líderes partidários nacionais podem alvitrar sobre os seus ganhos, mesmo que isto custe a ouvir. Por outro lado, não pode haver dúvidas sobre quem realmente venceu as eleições autárquicas no cômputo global, e neste caso foi o Partido Socialista (PS).

O PS ganhou mais Câmaras Municipais do que todos os outros Partidos Políticos, neste caso um pouco mais de 150 municípios; teve mais votos expressos enquanto Partido político (1.706.042); continua a ser o Partido com maior expressão nos núcleos urbanos; e tem todas as condições para manter a Presidência da Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP) e a Associação Nacional das Freguesias (ANAFRE).

Mas será que ficou tudo na mesma?
É claro que não.

A Direita e o Centro Direita, com o PSD a liderar, provaram ser capazes de desenhar coligações ganhadoras e alternativas à Esquerda, agregando diversos pequenos Partidos em torno de um mesmo projeto.

A Direita e o Centro Direita provaram que conseguem entrar nas zonas urbanas, bastando para isso atualizar a sua mensagem (exemplos disso foram as vitórias em Lisboa, Coimbra, Funchal, entre outras), deixando de estar acantonadas no interior do País, razão pela qual conseguiram a maioria das Capitais de Distrito.

A Direita e o Centro Direita, apenas ganham quando vincam as suas diferenças ideológicas em relação à Esquerda, apostando numa linguagem clara sobre qual o modelo económico e social que desejam para o País e qual o papel do Estado na organização da vida em Sociedade e, acima de tudo, falando a verdade, mesmo que esta seja dura e áspera.

É claro que agora várias serão as análises aos resultados, as quais tenderão a refletir os gostos de cada um dos analistas. Contudo, importa salientar que, face a 2017, quer o PS e quer o PSD, enquanto Partidos Políticos, perderam expressão eleitoral.

Em 2017 o PS obteve 37,81% com 1.950.289 votos e o PSD registou 16,12% com 831.536 votos; em 2021 ambos desceram, sendo que o PS passou para 34,25%, enquanto o PSD atingiu 13,25%, este último com 660.384 votos.
Não obstante essa redução do número de votos obtidos, nomeadamente no PSD, e contabilizados apenas os municípios em que concorreu sozinho, existiu um sinal claro de propensão a uma mudança do cenário político nacional.

Para isso terá contribuído, sem dúvida alguma, a vitória de Carlos Moedas na capital do País, dando mostras de que também em Lisboa a Direita e o Centro Direita podem renascer e dar voz a uma parte significativa da Sociedade que não se revê nos Partidos de Esquerda e na respetiva agenda.
Carlos Moedas, contra as sondagens que lhe impunham uma derrota, conseguiu arregimentar em seu redor largas franjas de votantes, para além de ter sabido juntar a si vários Partidos Políticos que provaram que não é apenas a Esquerda que é capaz de fazer geringonças com capacidade para governar.

Por outro lado, se Carlos Moedas foi uma escolha direta da Direção Nacional do PSD, onde Rui Rio pontifica como responsável máximo, é também bom que não se esqueça que o futuro Presidente da Câmara Municipal de Lisboa faz parte do viveiro de políticos que Pedro Passos Coelho criou em seu redor.

Carlos Moedas foi, durante bastante tempo, o braço direito de Passos Coelho na sua sombra, tendo chegado a Comissário Europeu onde se destacou, não apenas pela sua elevada capacidade de gestão dos dossiers a seu cargo, mas acima de tudo pelo diálogo que estabeleceu entre as diversas tendências políticas existentes no seio da Europa.

Algum tempo atrás, num determinado artigo de opinião, um político dizia, mais coisa menos coisa, que a boa moeda tem que afastar a má moeda para que a governação seja efetuada por líderes capazes.

Será então caso para perguntar: será que a Direita e o Centro Direita encontraram, finalmente, a sua boa Moeda?

NUNO GOMES (Director de A COMARCA DE ARGANIL)