
No dia 8 de Setembro, fez 35 anos que partiu para o “Sobral Valado do céu”, aquele que foi um dos grandes de A COMARCA, como alguém considerou,“um dos maiores colaboradores de A COMARCA” e que foi o padre José Vicente.
E porque é a 8 de Setembro que a Igreja celebra a Natividade da Virgem Maria, “8 de Setembro, dia lindo para morrer”, terá dito o padre José Vicente, uns dias antes de deixar este mundo, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, depois de ter passado por um longo Calvário carregando a sua Cruz do sofrimento que, até que as forças permitiram, tão bem soube descrever nas crónicas então publicadas no nosso jornal sob o título “Diário (imperfeito) de um internado em Santa Maria”.
Um “Diário (imperfeito” mas que não deixava de ser perfeito nas grandes mensagens escritas e que obrigavam a pensar, a refletir, como é breve e frágil a nossa vida e que o padre José Vicente tão bem soube transmitir, também o valor da amizade pelas muitas visitas, mensagens que lhe chegam enquanto esteve internado, sem esquecer o valor do amor e da dedicação (que tão bem exaltou) dos médicos e enfermeiras, dos auxiliares que o ajudaram a tornar menos penoso o longo caminho percorrido pelos corredores do Santa Maria.
Levou ainda muitas centenas de crianças pela primeira vez a ver o mar e à beira-mar
O padre José Vicente cumpriu, com paixão, vocação que abraçou ao serviço da Igreja e sempre norteado pelo Evangelho e pela mensagem de Cristo, serviu e ajudou os mais pobres e necessitados, “quando encontrava alguém com necessidade de comprar pão para matar a fome, dava-lhes os poucos escudos que tinha no seu porta-moedas” (como escreveu um amigo), defendeu aqueles que sofriam injustiças, também “visitou muitos doentes internados nos hospitais de Arganil, de Lisboa e de outras cidades do país”, levando-lhe palavras de conforto (e até ajuda monetária), levou ainda muitas centenas de crianças pela primeira vez a ver o mar e à beira-mar, à Praia de Mira, através das colónias balneares que, com a ajuda dos seus assinantes e amigos, foram patrocinadas pelo nosso jornal. Era a Colónia Balnear de A COMARCA. De boa memória.
Foi ainda um grande regionalista e também um grande jornalista que, através da sua caneta, tão bem soube exaltar as nossas terras e as suas gentes. Tão bem soube anunciar (e defender) tudo o que acreditava e defendia como sacerdote, a sua missão, o serviço à Igreja e aos irmãos, o padre José Vicente “era um homem da Igreja e do povo”.
O padre José Vicente está entre “aqueles que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando”
Por isso e citando Camões, podemos dizer que o padre José Vicente está entre “aqueles que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando”. Basta ler os seus escritos que, assinados com o seu nome próprio ou sob pseudónimos como Gil Duarte, Almeida Mendes ou Mendes Garcia, foram publicados em A COMARCA, o púlpito privilegiado que, durante muitos anos, utilizou e serviu para elogiar, mas também para denunciar não só na sua “Nota da Semana”, nos “Mundos & Fundos” (de entre outras secções) ou até mesmo em crónicas e reportagens que escreveu para o nosso (e seu) jornal. Foi de facto um grande jornalista.
Sub-director do Jornal do Lobito, em Angola, e jornalista do jornal “A Época”, em Lisboa
Natural de Sobral Valado, freguesia e concelho de Pampilhosa da Serra, onde nasceu no dia 27 de Junho de 1924, cresceu e depois de frequentar a escola primária da Pampilhosa da Serra, tinha cerca de 13 anos de idade foi frequentar o Seminário Menor da Nossa Senhora da Conceição, na Figueira da Foz, e mais tarde o Seminário Maior de Coimbra. Foi ordenado sacerdote na Sé Patriarcal de Lisboa, no dia 29 de Junho de 1948, começando o seu múnus sacerdotal no Machio, Portela do Fojo e depois “na sua sempre amada vila de Coja”, onde permaneceu cerca de 18 anos, ao fim dos quais partiu para a cidade do Lobito, em Angola, no dia 12 de Março de 1970.
No Lobito, o padre José Vicente foi ocupar o lugar de subdiretor do “Jornal do Lobito” e, mais tarde, regressado à então Metrópole, foi trabalhar no jornal A” Época”, em Lisboa, para pouco tempo depois, ser designado como assistente religioso no Centro de Observação do Tribunal Central de Menores. Na capital, criou o Grupo dos Sábados que prestava apoio particularmente aos conterrâneos que, na grande cidade, se encontravam em dificuldades, “para ajudar a comprar medicamentos, pagar rendas de casa e nalguns casos, para comprar roupas”. Celebrava missa na capela da Nossa Senhora da Oliveira, na Igreja de São Nicolau, na Capela da Nossa Senhora da Glória (no Bairro da Graça) e, por vezes, na Igreja de Santo Estevão, no Bairro de Alfama.
E 35 anos passados depois da sua morte, nunca é demais lembrar o quanto o padre José Vicente fez em vida pelos mais necessitados. Nunca é demais lembrar o seu empenho na promoção de encontros de vários grupos de defesa dos trabalhadores, entre os quais os “Almeidas” que varriam as ruas da cidade de Lisboa. Nunca é demais lembrar o homem, o sacerdote dedicado, o regionalista e jornalista que tinha em A COMARCA a “menina bonita dos seus olhos” e que serviu como “o veículo de transmissão dos seus pensamentos (…) sempre direccionados para o bem-estar, para o bem fazer”, para combater o bom combate na defesa destas terras e destas serras e das suas gentes.
O padre José Vicente foi de facto “um homem da Igreja e do povo”, capaz de nas suas homilias denunciar as injustiças, mas também de exaltar o bem, como tão bem o fez no que escreveu ao longo da vida nos vários órgãos de informação e particularmente na sua A COMARCA, que foi também uma das suas grandes paixões. E por isso e curvando-nos respeitosamente em sua memória, aqui o recordamos hoje, com saudade.