ARGANIL: Evocar o Maestro Alves Coelho

Em 2022 serão volvidos cento e quarenta anos (140) do nascimento de João Rodrigues Alves Coelho, eternizado como Maestro Alves Coelho e nascido em Arganil no dia 27 de Janeiro de 1882, descendente de João Rodrigues Alves e de D.ª Libânia Pereira Coelho.

Morreu em Lisboa e jovem, com apenas quarenta e nove anos de idade (49), corria o ano de 1931 e o calendário marcava o dia 23 de Outubro, mas mesmo assim deixou obra impressionante no panorama musical, com especial incidência no teatro, mais propriamente no “teatro de revista”, criação tipicamente portuguesa para mitigar as agruras da vida no nosso País à beira mar plantado.

Refazer a vida desta ilustre figura, talvez seja perceber a veia musical sempre presente nos arganilenses, que o digam o número fora do normal de filarmónicas existentes no concelho de nascimento de Alves Coelho.
Foi com o então Reitor de Arganil, Luís Caetano Lobo, que começou as suas primeiras aulas de música e, em 1893, partiu para Coimbra, com vista à frequência do seminário.

Após o falecimento do pai, em 1898, abandonou o seminário seguindo para Lisboa, onde estudou na Escola Normal Primária de Lisboa concluindo aí os estudos, passando a exercer o magistério primário, tendo sido nomeado para ensinar na Escola Oficial de Mafra em Lisboa.

No diploma da Escola Normal, consta que, tendo feito o exame de canto coral, nesse exame alcançou a classificação de 20 valores.
Mais tarde, demitiu-se do cargo de professor da Escola Oficial de Mafra e foi nomeado para um cargo do Ministério de Instrução, tendo, após esta fase, sido reintegrado no seu cargo de professor e nomeado Diretor da Escola Municipal nº 78 de Lisboa.

Uma personalidade cuja vida está vertida em várias edições d’ A Comarca de Arganil, centenário jornal, a partir do qual se poderá (re)fazer a sua história e que a região soube reconhecer ao inaugurar no dia 9 de Maio de 1954 um Cineteatro com o seu nome, que se espera em breve recuperado e devolvido, não apenas ao concelho de Arganil, mas acima de tudo à região de toda a Beira Serra.

Mais tarde, o concelho volta a evocar a sua memória atribuindo-lhe o nome de uma artéria na vila arganilense, a Rua Maestro Alves Coelho, cuja proximidade a uma outra Rua em homenagem também a uma outra figura emblemática, e neste caso o Dr. Fernando Valle, contribuem para enriquecer o registo toponímico desta localidade.

Contudo, não se ficou por aqui o tributo ao Maestro e, em Fevereiro de 2010, por iniciativa exclusiva do Provedor da Misericórdia, Prof. José Dias Coimbra, é criado o Orfeon Maestro Alves Coelho que, no culminar de uma década de existência, lançou um CD com o título “Giestas”, obra icónica de Alves Coelho, evocando o laborioso e engenhoso “músico” que deu origem ao nome do grupo Coralista.

Mas se a Misericórdia financiou tal obra “discográfica” foi, em primeira mão, como tributo a essa figura incontornável do panorama musical e em sua homenagem, para que ficasse nos registos da memória como mais um elemento inspirador das novas gerações de músicos a quem não basta o talento esforçado, é preciso também, a humildade dos vultos que perduram no tempo.

E, em bom rigor, o lançamento de tal obra foi precedida de uma conferência de A. César Quaresma Ventura sobre a vida e a obra do Maestro, tendo como palco a Igreja da Santa Casa, antecedendo aquilo que deveria ter sido a evocação dos noventa anos (90) sobre a morte dessa figura, mas que a Pandemia não permitiu celebrar em 2021.

A Misericórdia de Arganil guarda ainda, duas recordações da vida do Maestro, uma é a sua batuta e a outra é a sua caricatura que dá capa a um dos livros de Luciano Reis sobre a vida e a obra de Alves Coelho.

A título de curiosidade, e para os adeptos do Sport Lisboa e Benfica, compôs o Hino oficial desse clube (1929), cabendo a Félix Bermudes a autoria da letra.

O Maestro poderá ter tido vida curta, mas nesse pouco tempo marcou a musicalidade contemporânea portuguesa, escrevendo inúmeras obras, operetas e músicas, num contexto de dificuldade originada pela constante fadiga da vida de professor.

Ao longo da sua carreira compôs cerca de 8 operetas, 1 obra sacra, 15 obras diversas, 4 “vaudevilles” e cooperou em cerca de 40 produções de teatro de revista, afigurando-se como um dos principais autores de revistas, género em que mais se destacou.

Revistas como O 31 (1913), em palco durante uma década em Lisboa, Porto e várias cidades brasileiras; O dia do juízo (1915), com a canção de sua autoria Adelaides e Cartolinhas; O novo mundo (1916), com o emblemático Fado do Ganga; Lua Nova (1922); Cabaz de morangos (1926); Rosas de Portugal (1927); O manjerico (1928); Pó de Maio e Chá de parreira (1929) e Vamos ao vira (1931).

Trabalhou ainda, com diversos compositores, como Tomás Del Negro, Carlos Calderón, Luís Filgueiras, Raul Portela, Venceslau Pinto, entre tantos.
Já com autores fez parceria com Silva Tavares, José Galhardo, Alberto Sousa, Félix Bermudes, Ernesto Rodrigues, João Bastos e Eduardo Schwalbach.

Foi igualmente diretor musical e maestro do agrupamento musical Troupe Portugal, que atuou nos palcos de Portugal, Espanha e Marrocos, interpretando a sua música.

Esta azáfama criativa era sinal de que a sua genialidade se sobrepunha às dificuldades suscitadas pelas obrigações profissionais do ensino, tendo nesse contexto criado peças intemporais, ao mesmo tempo que ainda encontrou disponibilidade para ajudar a Filarmónica Arganilense (Associação Filarmónica de Arganil).

Poucos anos antes da sua morte, em 1929, foi condecorado com o grau de Cavaleiro da Ordem de Santiago da Espada, sinal do seu contributo para a cultura nacional e a projeção da língua materna além-fronteiras.

Evocar o Maestro Alves Coelho implica aceitar, com humildade, que a sua obra resultou da sua genialidade artística, alimentada pela sua entrega aos outros, sem ambições desmesuradas ou falsas aparências, e que só dessa forma foi merecedor dos enormes tributos que lhe foram prestados e continuarão a ser prestados.

Alves Coelho, nunca aceitou ser o trampolim para os “vaidosos” e os “ambiciosos” atingirem o estrelato, na medida em que era ele próprio a “estrela”, porque tinha luz própria e não era emprestada.