
Realizada na última quinta-feira, dia 28 de Março, a reunião magna da Misericórdia de Arganil ficou marcada pela eventualidade da deslocalização da atual estrutura do Centro de Saúde de Arganil, e o Serviço de Urgência Básica (SUB) aí localizado, para outro espaço fora do centro da vila de Arganil.
Os inúmeros irmãos presentes na Assembleia Geral da Misericórdia, para além de terem aprovado, por unanimidade, o relatório de atividades e contas relativo ao exercício de 2023, cujo resultado foi fortemente condicionado pelo incumprimento por parte da ARSC do pagamento de rendas devidas à Instituição, tiveram a oportunidade de terem conhecimento do ponto de situação relativo à questão da continuidade do Centro de Saúde em terrenos da Instituição arganilense.
Nesse contexto, a Mesa Administrativa deu a conhecer as reuniões já realizadas com as forças politicas com assento na vereação da autarquia, neste caso PSD e PS, através das quais manifestaram junto das estruturas locais desses dois Partidos, a preocupação com a possibilidade de construção de um novo equipamento da área da saúde fora do casco histórico da Vila de Arganil, com enormes impactos negativos para os utilizadores, mas de igual modo, para o comércio local e a consequente perda da centralidade da localidade.
A Mesa Administrativa assumiu ainda, perante os presentes na Assembleia Geral, e através da pessoa do seu Vice-provedor, ter sérias dúvidas sobre a continuidade da SUB em Arganil, caso se venha a concretizar uma solução de construção de uma nova estrutura, o que representaria um retrocesso para a região e a perda de importância e recursos para o concelho de Arganil, num contexto de profunda reformulação do Serviço Nacional de Saúde.
Recorde-se que toda esta situação decorre do processo de transferência de competências para a autarquia, e de um litígio que corre termos opondo a Misericórdia e a ARSC, invocando a instituição arganilense a ocupação, indevida e sem título, de espaço nos terrenos da Santa Casa e à revelia desta última, cujo entendimento e solução nunca mereceu, de acordo com os responsáveis pela Santa Casa, qualquer acolhimento pela ARSC.
Por outro lado, os representantes da Misericórdia deram a conhecer que têm vindo a dar nota de todo este processo, quer pelas vias informais e quer pelas vias formais, junto do Município manifestando este, através do seu Presidente, a abertura para ser encontrada uma solução que acautele os interesses de todas as partes.
Foi nesse contexto que a Assembleia Geral aprovou, por unanimidade, a atribuição de um mandato aos representantes da Instituição para negociar um acordo que permita, não apenas a retificação das áreas ocupadas, no âmbito de um contrato de direito de superfície celebrado em 2002, assegurando a continuidade da estrutura no local em que se encontra, mas de igual modo, o devido ressarcimento da Instituição por essa ocupação, que no entender da Misericórdia, é, atualmente, indevida.
Para o Vice-provedor, Nuno Gomes, e em representação do Provedor, António Carvalhais da Costa, “a solução jurídica para resolver esta questão não é de difícil implementação, desde que para isso haja verdadeira vontade “. Salientando ainda, “que a Instituição está disponível para abdicar do pedido duma indemnização que, atualmente, atingirá já valores superiores a dois milhões de euros, mas desde que seja assegurado o pagamento de uma renda pela ocupação do terreno.”
Para isso, “poderá ser revisitado o contrato de constituição de direito de superfície em vigor e cujo términus dista ainda 27 anos, havendo abertura da Misericórdia para prolongar esse direito de superfície para uma modalidade que assegure a permanência desses serviços de forma perpétua e desde que os fins sejam, exclusivamente, a prestação de cuidados de saúde e a Instituição devidamente ressarcida”.
Por seu turno, a Presidente da Mesa da Assembleia Geral, Cristina Figueiredo, destacou ser “revoltante que o Estado muitas vezes não tenha consciência do esforço realizado por estas Instituições, como é o caso da Misericórdia, para que as comunidades tenham acesso a serviços, com prejuízo para as suas finanças como foi no caso do exercício de 2023, onde a Instituição teve um resultado negativo pelo simples facto da ARSC não pagar, de forma autocrática, o que era devido, tendo sido necessário o recurso aos tribunais para que essa dívida venha a ser regularizada.”
Salientou igualmente, no caso do Centro de Saúde, “que a Misericórdia não exige mais do que aquilo a que entende ter direito, a começar pelo respeito da sua qualidade de legítima proprietária, bem como as deliberações tomadas pelos seus Órgãos Sociais”, questionando ainda, “o facilitismo pela forma como os recursos do PRR são invocados para soluções desenhadas no calor do momento e considerando apenas estratégias partidárias de muito curto prazo, e no presente caso da hipotética construção de um novo equipamento, PS e PSD deverão ter noção dos riscos que correm face às necessidades das comunidades.”
Finalizou realçando que “deslocalizar o Centro de Saúde para fora do centro da Vila será um estrondoso erro, agudizando os problemas de muitos comerciantes locais, acelerando a desertificação do casco histórico, colocando em risco diversos investimentos realizados por parte de pequenas empresas locais, podendo levar ainda ao encerramento da SUB, entre outras consequências”.
Hipótese de novo Centro de Saúde poderá suscitar especulação imobiliária
À margem da Assembleia Geral, A Comarca de Arganil questionou o Vice-provedor sobre se a hipótese de construção do novo Centro de Saúde tem já terrenos sinalizados, tendo o representante da Instituição, em substituição do Provedor, referido que desconhece tal aspeto e que “a Misericórdia tem trabalhado com o Presidente da autarquia para ser encontrada uma solução que salvaguarde os interesses da comunidade e da Instituição, não cabendo à Santa Casa avaliar a existência, ou não, de terrenos disponíveis para essa hipótese, pois não há qualquer interesse da Santa Casa nessa possibilidade”.
Contudo, não quis deixar de frisar que, “Deus pediu-nos para sermos santos, mas não anjinhos”, acrescentando “que qualquer negócio de compra e venda, e desde que respeite as regras legais, é legitimo, mas obviamente não podemos aceitar que alguns, em surdina e em pequenos círculos de amigos, vão defendendo a opção da mudança do Centro de Saúde, alegando ser benéfico para Arganil, e depois venham a vender, direta ou por interpostas pessoas, os terrenos destinados a esse fim. Isso será, no mínimo, pouco ético, e estou seguro que em nada contribuirá para os verdadeiros interesses da comunidade”.
Reforçou ainda, “é bom que as pessoas se recordem que no passado a possibilidade de construção do Centro de Saúde fora do centro da vila foi uma hipótese e já nessa época a discussão sobre os terrenos veio à baila, assim como eventuais interesses associados a esse processo. Curiosamente, à data, a continuidade do Centro de Saúde teve o apoio de duas pessoas de áreas políticas distintas, neste caso o Prof. Coimbra e o Dr. Carlos Teixeira, o que nos deverá fazer pensar que a verdadeira defesa da comunidade não é delimitada por linhas ideológicas, mas antes pela escolha das melhores opções”.
Terminou salientando que “a atual Mesa Administrativa tudo fará para defender a continuidade do Centro de Saúde no local onde se encontra, dentro da razoabilidade entre proteger os interesses da Instituição e os interesses da comunidade, não deixando de estar atenta aos supostos cidadãos generosos que terão terrenos disponíveis para essa hipotética mudança, sendo importante que a comunidade arganilense também esteja atenta”.