Contactado p’la A Comarca de Arganil, o Provedor da Misericórdia de Arganil confirmou a existência de duas ações judiciais contra a Administração Regional de Saúde do Centro (ARSC), salientando que “estas resultaram da falta de abertura ao diálogo, tendo em vista o estabelecimento de consensos e soluções para resolver algumas questões cuja ausência de desfecho seria prejudicial para a Instituição e a comunidade onde esta se insere”.
Sem querer entrar em pormenores relativos aos processos em curso, “por respeito à Justiça e ao tempo desta”, acrescentou que “uma das ações resultou da decisão unilateral que a ARSC tomou no início de 2020, sem procurar consensos ou sequer negociar, em alterar o valor das rendas relativas à ocupação de espaços localizados no antigo Hospital de Beneficência Condessa das Canas, desconsiderando uma relação contratual que data de 1981 e todo o seu histórico”.
Já a segunda ação é fruto da deteção pela Misericórdia, no âmbito dos trabalhos inerentes à empreitada de reabilitação do antigo Hospital, “de que a ARSC ocupava, sem título para isso, uma área superior à autorizada pela Assembleia Geral da Instituição, situação que teria de ser sanada, pois falamos do património de uma Instituição secular e decisões tomadas que vinculam quem é eleito para a Mesa Administrativa”.
Em ambos os casos o responsável máximo da Instituição arganilense, António Carvalhais da Costa, realçou “que desde a primeira hora, seja de modo formal, seja de modo informal, a Misericórdia procurou encontrar soluções, mas sem que daí tivesse havido da parte da ARSC qualquer tipo de disponibilidade para reunir, discutir seriamente os dois problemas e, em conjunto, encontrar as soluções adequadas, facto que não deixou outra alternativa à Instituição do que socorrer-se dos mecanismos judiciais para fazer imperar o bom senso e a salvaguarda dos legítimos direitos da Santa Casa.”
Acrescentou ainda que, “já no decurso das ações, a Misericórdia continuou a manifestar a disponibilidade para negociar e encontrar soluções, contrariamente à posição da ARSC que foi sempre irredutível, preferindo o confronto legal ao invés de pugnar por encontrar soluções. Soluções estas que existem e até são de fácil implementação jurídica, haja vontade para isso.”
O Provedor manifestou ainda ao nosso jornal, “ter uma enorme expetativa de que, mudando os interlocutores já no início de Janeiro, extinguindo-se a ARSC, seja possível o estabelecimento de consensos para ultrapassar as duas questões, que estão subjacentes às ações judiciais em curso”.
Na sua opinião, “a Tutela, muito provavelmente, desconhecerá que chegámos até aqui por falta de abertura por parte da ARSC para conversar e encontrar soluções”.
Quanto ao anúncio feito na última Assembleia Municipal de Arganil e relativa à descentralização de competências e às garantias dadas pela Tutela à Câmara Municipal de que serão inscritas verbas para a construção de um novo Centro de Saúde, não cabendo qualquer responsabilidade ao executivo camarário por eventuais compensações à Misericórdia, o Provedor deixou bem claro que “apesar de perceber o papel do Presidente da Câmara Municipal, nomeadamente de salvaguarda de todas as responsabilidades que poderão advir da descentralização de competências, não posso deixar de considerar a construção de um novo centro de saúde um disparate absurdo e cujo único responsável é a ARSC”.
Se tal vier a suceder, de acordo com o Provedor, “mostra bem como são geridos os dinheiros do PRR, ou seja, à medida dos interesses políticos imediatos, sem procurar encontrar soluções credíveis, optando-se por esbanjar dinheiro, e no caso concreto criando um problema onde ele ainda não existe e a existir resultará, unicamente e volto a frisar, da ausência de vontade para o diálogo por parte da ARSC”.
Depois, segundo o mesmo responsável, ” tal ato significaria que o investimento feito em 2004 e 2005, em resultado de uma colaboração entre a Câmara Municipal, a Misericórdia e a ARSC, sem esquecer o recente investimento na reabilitação do hospital, de nada teriam valido, pois seria deitar fora todo o dinheiro investido na construção do centro de saúde no local em que atualmente ele se encontra”.
“É ainda preciso recordar que o contributo da Misericórdia para a construção do atual centro de saúde, foi feito na base de um conjunto de pressupostos estabelecidos em contrato programa, com devida publicação em Diário da República, e que a alteração destes suscitará, aí sim, um problema e é bom que todos tenham a devida consciência disso”.
Por último, “a eventual construção e deslocalização do Centro de Saúde não ocorrerá em tempo útil, e tenho sérias reservas que seja concretizável até 2026.”
“Além de que, se for esse o caminho, que diga-se apenas acontecerá se não houver vontade de resolver as questões existentes, e seguramente a falta de vontade não é da Misericórdia, os serviços terão que continuar sediados no espaço onde atualmente estão, com duplicação de custos, ou seja, manter em funcionamento a estrutura existente e, simultaneamente, construir uma nova, dando a sensação que estamos num País rico.”
Para além disso, afirmou o Provedor, “retirar o centro de saúde do local onde se encontra é fraturar o perímetro da saúde em Arganil, prejudicando com isso a comunidade”.
“A atual localização do centro de saúde e do Serviço de Urgência Básico (SUB) são potencializadas pela concentração de diversas respostas da área da saúde, sejam elas do setor público e sejam do Setor Social, já para não falar do impacto negativo em todo o contexto comercial da vila de Arganil, se essa deslocalização vier a suceder”.
Na eventualidade deste anúncio ser uma forma de pressão, mesmo que indireta e subtil, junto da Misericórdia, António Carvalhais da Costa deixa bem claro “que a Instituição limitou-se a zelar pelos seus legítimos direitos, não tendo que se vergar à prepotência, de quem representando o interesse público não respeite as organizações da Sociedade Civil e a sua legitimidade”.
Estranhou ainda, até “o momento do presente anúncio de verbas para um novo centro de saúde, na medida em que as ações judiciais em causa já correm há cerca de 4 anos, sendo transversais a dois mandatos da Misericórdia, nunca tendo esta Instituição falado publicamente sobre o assunto, denotando, claramente, a pouca vontade da ARSC em resolver esta situação”.
E questiona, “afinal a quem é que não interessa que exista em Arganil uma plataforma forte na área da saúde, concentrando recursos dos Setores Público e Social, especialmente agora que a Misericórdia tudo está a fazer para colocar em funcionamento o reabilitado Hospital de Beneficência Condessa das Canas?”
Termina referindo, “será um erro crasso e estratégico para o desenvolvimento do concelho e da região interior do Distrito de Coimbra, desmembrar e deslocalizar a estrutura de saúde atualmente existente na vila de Arganil, cujo potencial de crescimento está associado ao desenvolvimento de novas respostas aproveitando o agora reabilitado Hospital Condessa das Canas”.
“Deslocalizar e construir um novo centro de saúde será transformar essa estrutura em mais uma estrutura idêntica a tantas outras existentes no País, ao invés disso, a aposta deverá ser mantê-la e reforçá-la com a presença e participação de outras entidades que venham a acrescentar novos serviços à comunidade”.