
Desde sexta-feira e sábado passados, no Átrio de Exposições Guilherme Filipe e, simultaneamente, no multiusos da Cerâmica Arganilense, está patente a exposição “Corpus Hermeticum de Luz”, do artista arganilense Mário Vitória, que se traduz e segundo as suas palavras, “numa ampla mostra de obras, proveniente de várias fases, séries, datas e temáticas. Uma galáxia de muitas moradas, corpos de várias latitudes que se unem num grande propósito que é o da viajem pelo âmago humano”.
Na sua inauguração, mais do que a arte, esta exposição levou também a uma “viagem” pela cultura com a conferência/conversa, no salão nobre dos Paços do Município, com o tema “Ouvir o musgo a crescer”, com Boaventura de Sousa Santos (activista e escritor), José Manuel Simões (comissário da exposição), António Manuel Ribeiro (músico dos conhecido UHF e activista cultural), Joaquim Pinto da Silva (editor e activista cultural), presidente da Câmara Municipal, Luís Paulo Costa, todos unânimes em reconhecer, enaltecer “o percurso e brilhantismo das obras de Mário Vitória”.
“É um orgulho muito grande, enquanto representante dos arganilenses, poder ter um ilustre arganilense a trilhar um caminho de tanto sucesso nesta área das artes”, como reconheceu o presidente da Câmara Municipal, para referir depois que “este processo teve início há uns meses atrás, na reitoria da Universidade de Lisboa”, o que “comprovou aquilo que é o percurso, o brilhantismo, da obra de Mário Vitória”. E depois de “fazer algumas breves referências às múltiplas exposições individuais e coletivas em que o Mário tem participado”, não deixou de enaltecer também “aquilo que é a sua responsabilidade de professor de desenho e pintura e os seus múltiplos trabalhos de criação de imagem e ilustração para capas de vários livros, de espectáculos e de obras institucionais (…), algumas delas que estão na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra”, sem esquecer ainda “a sua colaboração com a Federação Portuguesa de Natação, através de obras para a representação e apresentação do Comité Olímpico, particularmente aquando os Jogos Olímpicos de 2016 e 2020”.
Luís Paulo Costa fez depois uma referência “à obra ‘Aprendizagens Globais’, a mais bonita do Mário, que temos aqui connosco, mesmo na parede do átrio da Câmara”, congratulando-se também com “o interesse académico que a obra do Mário já suscitou, nomeadamente para uma dissertação de doutoramento” e do “destaque que mereceu, por parte da revista Arganilia, particularmente, em 2019”, recordando por isso que, “em 2020, reconhecendo o papel relevantíssimo de Mário Vitória no mundo das artes, a Câmara Municipal deliberou, por unanimidade, atribuir-lhe a Medalha de Mérito Cultural” e que, “em 2020, também gostei muito de ver a maquete da obra que o Mário fez para o Município, uma obra extraordinária, que está junto à igreja do Piódão, ‘O Ser Montanhoso’, mas também o caixilho, uma brilhante ideia, designado de Guarnecer Gerações”.
“A primeira obra que vi do Mário foi numa Feira de Arte, em Lisboa, numa vertente que, neste ciclo de exposições, acabou por não estar exposta, que tem a ver com as naturezas assassinas”, começou por referir o comissário da exposição, José Manuel Simões, para salientar depois que o artista arganilense “gosta de trabalhar em grandes escalas, (…) fez uma obra notável para os Jogos Olímpicos de Tóquio e está a desenvolver outra para os Jogos Olímpicos de Paris. (…) O Mário Vitória é um artista que tem uma criatividade imensa”.
E depois de dar a conhecer que “na Universidade de Lisboa, estamos a comemorar os 10 anos da Universidade e pensou-se neste conjunto de exposições”, José Manuel Simões referiu que “falando com o Mário, fomos buscar os seus amigos, alguns que escreveram para os seus vários catálogos e hoje, estamos a inaugurar a última das seis exposições que foram programadas”, sendo que “a primeira começou no dia 27 de Setembro, na reitoria da Universidade de Lisboa”, seguindo depois “para o Museu Teixeira Lopes, em Vila Nova de Gaia (… e finalmente para fechar este ciclo de exposições, estamos aqui em Arganil”.
“É uma noite de emoções, é uma emoção estar aqui que, de alguma maneira, é o regresso às raízes”, disse o Professor Boaventura de Sousa Santos, ao recordar a sua vinda às festas do Mont’Alto, com seus pais (da freguesia de S. Pedro de Alva), salientando também que “senti uma emoção forte ao ver a Cerâmica Arganilense, edifício absolutamente extraordinário que conseguiram fazer e que merece que hajam bienais, festivais para que possam ver a densidade de um país” e, falando depois nas obras do artista arganilense, referiu que “os meus livros são capas de Mário Vitória e viajam pelo Mundo”, considerando que “é um artista obsessivo”, que não “esquece as suas raízes, porque é com elas que a gente voa”, pelo que os arganilenses se devem sentir orgulhosos “por ter aqui um artista do calibre do Mário”.
Mário Vitória deixando “um simples e sincero grande obrigado”, agradeceu ao Município pela forma como tem vindo a ser recebido, confessando depois que começou a inspirar-se em “alguns professores que me habituei a ver aqui em Arganil”, entre os quais “o professor Ventura”, salientando que “fico muito comovido sempre que venho a casa porque há muita coisa em circuito neste silêncio que ainda se ouve na nossa região” onde, e como considerou, “existe uma certa ruralidade desejada porque é com essa ruralidade que se chega ao mundo cosmopolita”.
“A minha avó era padeira e graças ao pão dela eu fiz-me pintor”, disse Mário Vitória, acrescentando que “para não estragar as farinhas e se atrasar nos trocos, a minha avó enchia-me de livros na varanda e eu desenhava a olhar para a serra” e que evoca nas suas obras “a natureza que corre pelas nossas veias”, sem deixar de reconhecer também que “estou muito apoiado em ombros de gigantes que estão aqui comigo nesta mesa” e que continua a inspirar-se “aqui nesta minha zona, onde respiro, sei o xisto, o frio e o quente que passa aqui, este lado de estar debruçado na orla de uma montanha, as pessoas do Piódão que caminhavam descalças nos tempos de neve, esta resistência e este museu ao ar livre que é a nossa região”.
Nesta exposição e ainda segundo o artista, está “um pedacinho de um pequeno carvão queimado que retirei da Fraga da Pena, da base da cascata, para não esquecermos esse trágico incêndio de 2017”, manifestando a sua satisfação por conseguir “fazer objectos que possam prender as pessoas para lá dos cinco minutos” e, referindo ainda, que “esta exposição foi uma tentativa audaz, se calhar muito atrevida, de dar às pessoas balões de oxigénio. Aqui, testamos, com vários conhecimentos, possibilidades de energizar perante o precipício”, deixando a certeza que “vou utilizar o meu trabalho para desacelerar as pessoas e regar raízes porque acredito que os nossos problemas são os mesmos do Egipto antigo e do induísmo, budismo, e estamos aqui para amar e perdoar e isso é um sarilho tremendo”.
O conhecido músico dos UHF, António Manuel Ribeiro, depois de manifestar a sua satisfação por “estar no interior do meu país que comecei a conhecer quando me formei músico” e de ter palavras de particular apreço para o seu amigo Mário Vitória, “finalmente tens um espaço à dimensão dos teus painéis” (a Cerâmica Arganilense), pedindo ao presidente da Câmara “tem que criar um vulcão naquela fábrica, qualquer coisa que faça as pessoas virem a Arganil”, terminando com a interpretação, sentida, de dois temas, particularmente com a canção que fez para a Ucrânia. E por dizer “é tão bom estar aqui, todos juntos, pela arte de Mário Vitória”.
E foi essa arte que, no sábado, no multiusos da Cerâmica, voltou a juntar muitos amigos, “este espaço tem a dimensão certa para a dimensão desta obra de Mário Vitória”, para visitar e acompanhar a visita às obras (de maior dimensão) do artista arganilense ali expostas e que foi comentada pelo comissário da exposição, por Joaquim Pinto da Silva e por Nuno Mata, um cojense, professor e historiador que, nas suas intervenções (que iremos publicar em próximas edições) tão bem soube retratar o amigo e conterrâneo que é Mário Vitória.
“É um artista da terra fantástico, não é preciso dizer muito mais deste conjunto de obras marcantes”, como disse o comissário da exposição, recordando eu algumas das peças á estiveram expostas na reitoria da Universidade de Lisboa, em Guimarães, Capital da Cultura em 2912 e “nada melhor do que terminar este ciclo em Arganil”.
“Obrigado, Câmara Municipal de Arganil, por me apoiarem”, disse Mário Vitória, sem deixar de recordar também que a Cerâmica “era uma ruína e agora tem uma catedral no meio da serra”, enquanto o presidente da Câmara voltou a referir que “é um gosto ter as obras de Mário Vitória nesta casa dos arganilenses”, tendo o presidente da Assembleia Municipal, António Cardoso, considerado que “fiquei maravilhado com a ‘viagem’ aqui feita”, enaltecendo o trabalho do grande artista arganilense, natural de Coja que está representado em inúmeras colecções oficiais e particulares, nacionais e internacionais. É Mestre em Ensino em Artes Visuais na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação do Porto, Mestre em Práticas e Teorias do Desenho na Faculdade de Belas Artes na Universidade do Porto, especialização em Práticas e Teorias do Desenho na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, Programa Erasmus, Accademia di Belle Arti di Bolonha (Itália), licenciatura em Pintura na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, Programa Sócrates, Lycée Leonardo Da Vinci – Lyon (França).
Na Cerâmica e no final da visita à exposição, em breves declarações ao nosso jornal, Mário Vitória disse que “resta dizer, uma vez mais, obrigado aos arganilenses, por mais uma vez ter também muitos ombros onde me apoiar, está cá o fresco das manhãs, as coutadas, este lado bucólico, mas também da proximidade cosmopolita que temos com Coimbra, Viseu e outros pontos da serra que nos permite deslocarmo-nos com facilidade para qualquer lado, estarmos no centro, esta versatilidade, estarmos em Arganil é estar perto de todo o país, estamos mesmo no coração. E eu cresci e na minha obra pode não se ver de imediato, mas está lá esta amizade, esta resistência e resta-me dizer outra vez isso, para não esquecermos e eu próprio não me esquecer disso”.
Lembrando a sua avó Maria, padeira, “e da minha mãe desenhando para mim”, Mário Vitória refere que “sempre que vinha do trabalho, por exemplo e houve um dia em que vinha cansada e não desenhou para mim, eu rasguei o caderno e depois, mais tarde, mais calmo, pedi para ela voltar a desenhar e juntar os pedacinhos todos do caderno e não deu para os juntar e, talvez por aí, por essa ânsia a vontade de desenhar”. E por isso está e apesar das dificuldades da vida, está na “vida da arte e como eu estou na arte, não há volta a dar para trás, porque sinto-me muito bem, sinto-me mais enérgico quando estou a fazer o que estou, claro que tem a subsistência, tenho que vender para continuar a pintar coisas novas, mas sinceramente isso vem com muita naturalidade, foi-me acontecendo,