MISERICÓRDIA DE ARGANIL: Homenagem ao saudoso médico Carlos Teixeira

No dia 5 de Julho e enquadrado no âmbito das centenárias celebrações em honra de Nossa Senhora da Visitação, a Santa Casa da Misericórdia de Arganil homenageou o saudoso médico dr. Carlos Maia Teixeira, perpertuando o seu nome numa das salas do Hospital de Beneficência Condessa das Canas.

“A homenagem ao dr. Carlos Teixeira não é apenas porque foi um médico dedicado nesta Santa Casa. Não é apenas porque trabalhou num hospital em que hoje nos encontramos, mas também porque esteve presente em alguns dos projectos desta instituição, nomeadamente o lançamento do projecto do Hospital Dr. Fernando Valle em 2001, pensado como complemento ao Centro de Saúde de Arganil para situações de doentes terminais”, como referiu o vice-provedor da Misericórdia, dr. Nuno Gomes, recordando ainda que “em 2009 esteve no arranque do projecto da reabilitação do Hospital de Beneficência Condessa das Canas” .

E por isso foi naquele Hospital e no espaço em que o dr. Carlos Teixeira trabalhou durante décadas, que a mesa administrativa da Misericórdia quis que fosse “recordado e relembrado. (…) Ele tinha um sonho de colocar este edifício em funcionamento. Em 2009, ele dizia, o Centro de Saúde Arganil e as urgências precisam de uma unidade de internamento acoplada. O sítio ideal era reabilitar-se este edifício”, disse ainda Nuno Gomes, “e obviamente não poderíamos deixar de homenageá-lo aqui, porque quando este edifício voltar a funcionar, estar ao serviço da comunidade com uma Unidade de Cuidados Paliativos, (…) estamos a crer que em breve ela entrará em funcionamento e, quando entrar em funcionamento, as pessoas que vierem para esta casa têm que saber quem foi Carlos Maia Teixeira”.

“A Misericórdia tem um lema. Somos uma instituição com memória e futuro, e obviamente, Carlos Maia Teixeira faz parte da nossa história. E sob esse lema não poderíamos deixar de o recordar para as gerações futuras”, disse ainda o vice-provedor da Santa Casa da Misericórdia de Arganil, cabendo depois à presidente da assembleia geral, Cristina Figueiredo, “falar um pouco da história de vida de Carlos Maia Teixeira”, considerando que “foi muito mais do que um médico, foi um dos principais impulsionadores da continuidade e construção do nosso Centro de Saúde, uma obra que transformou a vida não só da nossa vila, mas de todo o nosso concelho e até da nossa região” e, por isso, “seria um acto de imperdoável ingratidão celebrar os 20 anos de funcionamento deste espaço vital inaugurado a 4 de Fevereiro de 2005, sem recordar o nome daquele que foi um dos seus grandes obreiros. Sem o seu contributo, enquanto membro da então Comissão de Saúde concelhia e director da Unidade de Saúde Local, o edifício do actual Centro de Saúde Arganil, o Serviço de Urgência Básico provavelmente não existiriam”.

E recordando “o médico dedicado, o cidadão exemplar e o amigo inesquecível que foi dr. Carlos Maia Teixeira”, Cristina Figueiredo reproduziu um texto com o vasto currículo sobre “a vida e obra de quem viveu como autêntico cidadão, ou seja, colocando toda a sua ciência, vontade e benemerência ao serviço de múltiplos sectores da vida social”. Nascido em Coimbra em 2 de Outubro de 1950, e nesta cidade veio a falecer a 14 de Janeiro de 2025, com a vinda para Arganil fixou-se em Folques, na sequência do casamento com Graça Maria Paiva Gomes. Pai de Carlos Renato e Marta Raquel Teixeira, “foi na sua amada Coimbra que iniciou a vida académica”, se licenciou em Medicina “até ser colocado, no âmbito dos serviços à periferia, no Centro de Saúde de Arganil”, assumindo anos mais tarde a sua direcção entre 2014 e 2017 e, a sua actividade, “levou a exercer funções no Lar de Idosos da Santa Casa da Misericórdia de Arganil e, posteriormente, na Assistência Folquense nas valências do Lar, Centro de Dia e ATL e, convidado, assumiu ainda a direção da Unidade de Cuidados Continuados da Santa Casa da Misericórdia de Tábua.

“Por morte do dr. Adelino Dias, um natural de Avô que foi seu colega de curso e que exercia na Ilha açoriana do Corvo, o dr. Carlos Maia Teixeira rumou até aquelas paragens atlânticas em 2017, onde permaneceu até a aposentação em 2020”, referiu ainda a presidente da assembleia geral da Misericórdia, recordando que “para além do exercício médico, (…)  também dedicou parte da sua vida à investigação, com trabalhos publicados, foi um desportista destacado no xadrez, no basquetebol, em hóquei patins, dirigiu o sector médico do extinto Grupo Desportivo Argus, bem como o desaparecido Moto Clube de Arganil, foi fundador da Confraria Gastronómica do Bucho de Arganil, a par das organizações filantrópicas ou de cultura e recreio, integrou o conselho editorial da revista Comunidades da Língua Portuguesa e do Centro de Estudos Americanos Fernando Pessoa, no Brasil. Fez parte da direção e conselho redatorial da revista Arganilia, Editorial Moura Pinto, Associação 25 de Abril, Amnistia Internacional, AMI – Associação Médica Internacional, Sociedade Portuguesa de Escritores e Artistas Médicos e Núcleo de Cultura Portuguesa de Santo Domingo, em Cuba. Ainda no âmbito cultural, para além das conferências proferidas em diversos locais do país e do estrangeiro, foi colaborador literário do jornal A COMARCA DE ARGANIL, e publicou diversos trabalhos em prosa e poesia, tanto em edição de autor como em revistas ou jornais, nomeadamente na Editorial Moura Pinto, Arganilia, Revista das Comunidades Portuguesas

Mas Carlos Teixeira foi também atraído pela fotografia e, desde muito novo pela política, “a sua atividade foi desenvolvida no seio do Partido Socialista, mas sem dogmas ou pretensões a cargos”,  tendo sido presidente da Assembleia de Freguesia de Folques, presidente da Comissão Política Concelhia de Arganil do Partido Socialista e membro dos órgãos distritais, deputado municipal em Arganil, candidato à Assembleia da República, integrando até a comissão concelhia para a reeleição do dr. Mário Soares, salientando Cristina Figueiredo que “na sua ação política, que entendeu sempre como um acto de solidariedade e não palco de vaidades ou de animosidades, o dr. Carlos Maia Teixeira preferiu sempre a persuasão à discussão” e, “apesar dos cargos que ocupou, da forma como opinou ou das decisões que tomou, (…) nunca teve inimigos ou adversários políticos. Pode ter assumido naturais posições discordantes ou dissonantes, mas mesmo os que não acompanhavam ou contestavam, era sempre cidadãos que se situavam noutra posição. E apenas isso, (…)  ou seja, o de um autêntico cidadão, porque viu sempre no outro, não apenas um seu semelhante, mas isso sim, um outro irmão”.

O dr. Carlos Maia Teixeira foi “um sonhador, um poeta” e alguém que partilhou com ele “alguns momentos sobre essa mesma poesia”, como o seu amigo João Bilha que declamou dois dos seus poemas, sem deixar de o considerar alguém de “gestos simples, olhar profundo, coração bondoso, ternura nas atitudes, eram características do saudoso dr. Teixeira. Alguém que usava os seus dons para amar mais e mais os que o rodeavam. Que era através do seu profissionalismo, que era através de poemas que escrevia com alma e paixão”.

Profissionalismo e paixão que também foram exaltados pelos médicos dr. Pinto Monteiro. dr. Carlos Saraiva e dr. Nuno Rebelo ao falarem “de um grande, grande amigo, que há pouco nos deixou mas que não nos deixou” , o Carlos Maia Teixeira que “permanece bem vivo na minha memória e, de certeza, na memória de todos quantos tiveram o privilégio de conviver com ele”, sem deixarem de “percorrer e a revisitar alguns dos caminhos abertos por este ilustre e dedicado médico e cidadão de corpo inteiro, através da sua obra, das suas realizações concretas, de um homem que estava na luta, que lutava por ideais e pela sua concretização na terra dos homens, dos homens de carne e osso e em várias dimensões, como médico, como homem de cultura, como cidadão e poeta”.

“Como médico, Carlos Maria Teixeira foi um autêntico João Semana, pela sua generosidade, pela sua disponibilidade, pela sua dedicação. A porta da sua casa estava sempre aberta para quem dele precisasse, novos ou velhos, ricos ou pobres, homens ou mulheres, vips ou simples pessoas sem abrigo”, recordou ainda o dr. Pinto Monteiro, considerando que “a homenagem que a Santa Casa da Misericórdia de Arganil lhe presta é um testemunho da acção determinante desenvolvida e um reconhecimento da importância da sua obra. (…) Foi um homem generoso, solidário, dedicado a causas sociais, sempre disponível, apaixonado, arrebatado, culto e que passou pela vida com grande dignidade, (…) tendo procurado sempre ser útil ao mundo que o rodeou, tendo procurado ser útil à comunidade em que se integrou”.

“Conheci a família do Carlos, conheci o pai, conheci a mãe por quem ele tinha uma veneração muito especial, conheci os irmãos, conheci logo pelos seus 17 anos uma grande sede de viver, alguém falou aqui num homem apaixonado, no sentido de querer absorver todos os estímulos que a vida pode, efectivamente, dar, portanto alguém que vai não passar pela vida, mas sentir em plenitude a vida, em todas as vertentes, algumas já foram aqui afloradas, mas era um jovem inquieto, isso é indiscutível”, disse o dr. Carlos Saraiva, recordando ainda a sua paixão pelo xadrez, “um dos mais extraordinários jogadores de xadrez que passou pela Associação Académica de Coimbra”, alguns episódios da sua irreverência que o levou mesmo a ser preso pela PIDE, “depois tive a ocasião também de jogar com ele bilhar, ele era um exímio jogador de bilhar, (…) ele era especial. Era uma pessoa apaixonada pela vida. Médico, poeta, escritor” (cujo acervo não deveria ser perdido) e que “viveu intensamente a vida e, portanto, acho que esta homenagem é inteiramente justa”.

E perante esta preocupação manifestada pelo dr. Carlos Saraiva sobre o acervo deixado por Carlos Maia Teixeira, Nuno Gomes transmitiu à sua viúva, Graça Paiva Gomes “que pode contar com A COMARCA para não deixar cair no esquecimento esse acervo, (…) que não se deve perder, ainda por cima, com a forte ligação que tem ao concelho de Arganil”, tendo ainda o dr. Nuno Rebelo recordado as “últimas horas” do amigo que “partiu de madrugada e ficou por dar um, mesmo que doloroso, último abraço. (…)  Era tão fácil gostar do Carlos. (…) E a minha memória, velha de cinquenta anos, revivifica-se, reata-se e continua ad eterno”.

E a memória de Carlos Maia Teixeira foi depois reavivada com “uma mensagem do vosso amigo Laurent Philippe, ao som da música que ele tanto gostava”, com a sua voz em algumas gravações, que acabaram por levar às lágrimas a família, os muitos amigos presentes nesta sentida homenagem que, como disse o eng. Ricardo Pereira Alves “era uma pessoa inspiradora, muito firme nas suas convicções, mas muito leal no debate e no confronto. E era de facto inspirador conversar com ele e podermos perceber uma pessoa de uma grandeza humana extraordinária e uma pessoa com um pensamento livre, puro, genuíno e que acreditava mesmo de que o mundo poderia ser um lugar melhor para todos”, considerando que “apesar de não ser de Arganil, o dr. Carlos Teixeira “mereceu o apreço e a consideração dos arganilenses, (…) é um arganilense, porque foi das pessoas que mais exaltou a arganilidade”.

Emocionado, o filho Renato falou sobre a dolorosa partida e a perda de seu pai, mas “fico feliz por ficar e existir uma marca dele aqui. O meu pai foi alguém que sempre trabalhou muito para os doentes, muitas vezes à custa da vida pessoal e familiar. Era um homem que trabalhava acima de tudo para a sociedade, um dever cívico mais do que um ganha-pão”, deixando o seu “obrigado a todos os que estão presentes e a todos os que estão por trás desta iniciativa e que expressam também a vossa saudade e reconhecimento ao meu pai”, cuja partida “nunca vai deixar de doer, mas devemos-lhe a força de continuar os seus e os nossos caminhos. (…) Carlos Maia Terceira, sempre!”.

O eng. Rui Silva, “o amigo que esteve presente, com ele, numa das tarefas mais árduas que foi efectivamente a construção do Centro de Saúde de Arganil”, também não deixou de recordar os “vários momentos, no desporto, na saúde, na política” que esteve com o dr. Carlos Teixeira “e numa forma peculiar e altruísta de exercer uma medicina de proximidade foi um privilégio para mim, (…) vivemos juntos um episódio de enorme complexidade e de grande importância, não só para o concelho de Arganil como para a região envolvente” e que foi a criação de um grande Centro de Saúde em Arganil, centralizador e com dimensão regional, contrariando algo que então estava previsto. Tanto disse, tanto agitou e tanto fez notar, Arganil podia vir a reunir condições ímpares na região. Saúde versus melhores condições de vida, de atendimento e de prestação de cuidados de saúde para Arganil e para a região. Ele tinha razão. O dr. Teixeira estava certo. O que mais importava era a melhoria das condições de saúde para os doentes”.

“Arganil conseguiu ganhar esse desafio. Arganil foi colocada no topo da região. O dr. Teixeira venceu. A Comissão Municipal de Saúde venceu. A sociedade civil venceu. E os doentes venceram”, considerou ainda Rui Silva, enaltecendo a sua dedicação e empenhamento nas causas que abraçava, deixando um “voto de louvor à Santa Casa da Misericórdia de Arganil por esta justa e devida homenagem” porque, e como considerou, “homenagear é lembrar. Homenagear é respeitar”.

O presidente do Secretariado Regional Coimbra da União das Misericórdias, António Sérgio Martins, referiu que “estamos perante uma instituição que, claramente, valorizou o passado, vive o presente e projecta o futuro, (…)  esse futuro vai ficar aqui perpetuado por esta pessoa que tanto deu nos valores, nos princípios, na entrega, na generosidade” que foi o dr. Carlos Maia Teixeira, que “como já disse, com a tristeza de não podermos estar com ele fisicamente, mas com uma grande alegria das memórias, daquilo que tudo ele nos deixou e, sobretudo, destes magníficos testemunhos que vos fazem ainda sentir mais e muito mais, em estarmos aqui presentes nesta homenagem e ter muito mais orgulho no vosso pai, no seu marido, porque é assim, passando à outra fase, que nós podemos efetivamente perspectivar o futuro”, que “só faz sentido se for assente naquelas pessoas que nos marcaram, porque são elas que nos vão dar mais força aos valores e aos princípios, para podermos continuar a fazer aquilo em que acreditamos. E esta Misericórdia, com todos estes anos que carrega às suas portas, tem o futuro, com certeza, garantido. E esse futuro vai ficar aqui perpetuado por esta pessoa que tanto deu nos valores, nos princípios, na entrega, na generosidade. (…) Viva o doutor Carlos Maia Teixeira! Viva a vossa família!”.

O provedor, António Carvalhais da Costa considerou “Carlos Teixeira o homem de convicções, um guerreiro, um lutador, lutava por causas”, recordando o tempo que passou pela Misericórdia, as lutas travadas “era um lutador que nunca ia deixar ninguém no meio da eira, sozinho. Era o camarada, era solidário, era o indivíduo amigo em quem nós podíamos confiar”, referindo que “o Centro de Saúde foi feito aqui, com a sua luta”, (…) a seguir, ele lutou pelo SUB chamadas Urgências, (…) por isso, o Carlos Teixeira foi um homem que deu muito de si a esta instituição. Sempre a respeitou, sempre lutou por ela. E nós, hoje, estamos aqui a fazer a justiça para que, no futuro, os nossos netos, (…) já não estamos cá para contar a história mas vai estar uma placa para que continue o futuro. Precisamente, nesta sala que vai ficar com o nome dele nesta instituição, neste hospital, por quem ele muito lutou e trabalhou”.

“A Misericórdia da Arganil só tem que se congratular em ter homens como este e outros colegas que por cá passaram” e, “por isso, aqui estamos hoje a prestar esta grande homenagem, esta precisa homenagem de que ele muito merece e assim vai perpetuar para o futuro”, disse ainda o provedor, convidando a família para o “descerramento da placa evocativa da sua passagem por aqui, mas acima de tudo da sua entrega a esta casa”, dando o seu nome à agora designada Sala Carlos Maia Teixeira.