NOTA DA SEMANA: A Europa aguarda pela França

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No próximo dia 24 de Abril, véspera do nosso dia da liberdade, realizar-se-á a segunda volta das eleições francesas destinadas a eleger o Presidente da República Francesa para os próximos 5 anos.

E, mais uma vez, os franceses terão que escolher entre Emmanuel Macron, atual Chefe de Estado e Marine Le Pen.

Embora este seja um duelo que se repete, nada tem de igual com o anterior, aliás está bem longe disso.

No passado, Macron ganhou contra Le Pen com uma vantagem significativa, juntando grande parte da sociedade francesa, num misto de novidade e desespero.

Macron era então o candidato da jovialidade, que se apresentava como o líder talhado para estabelecer na França uma visão de modernidade e futuro, casado com uma senhora (Brigitte Macron) de mais de 60 anos (69), representando com isso uma intergeracionalidade despida de preconceitos, e movendo-se contra a visão de uma Direita classificada de extremista, radical e até xenófoba, daí também o desespero de parte dos seus votantes que se mobilizaram contra esse radicalismo.

Contudo, terminado o primeiro mandato de Macron, a desilusão instalou-se numa parte significativa daqueles que nele antes tinham votado, alicerçada numa crise económica e até de identidade nacional.

A França de hoje está mudada, a sua Sociedade está estratificada mais do que nunca, e os receios religiosos e culturais são mais do que evidentes.

A França universalista, dos direitos e dos princípios (Liberté, Égalité, Fraternité ), sucumbiu nessa espiral de massificar para todos os que nela residem uma visão humanista do Estado.

Sucumbiu e perdeu-se pela simples razão de que nem todos estão preparados para conviver com a Liberdade, Igualdade e Fraternidade, e que o digam os terroristas do jornal satírico “Charlie Hebdo” que em 7 de Janeiro de 2015 foi atacado.

Para juntar a isso, tivemos depois, e já Macron era Presidente da República, uma crise económica que deu origem a um movimento inorgânico e incontrolável que ficou conhecido pelos “coletes amarelos”, os quais durante semanas, e meses, a fio, pararam o País.

Mais recentemente, a pandemia do COVID-19 permitiu que fosse ensaiada na França dos direitos e garantias, restrições à liberdade dos cidadãos que se recusassem a tomar a vacina, suscitando um amplo debate sobre os limites da intervenção do Estado no campo da saúde pública, quando esta colide com direitos individuais do cidadão e manchando, ainda mais, a imagem de Macron, agora como atacante dessas liberdades e garantias.

Ao contrário de Macron, Le Pen não teve que se debater com essas dificuldades e muito menos com essas reflexões existenciais, mantendo na essência a sua mensagem, mesmo que mais suavizada e adequada aos novos tempos.

E com efeito, Le Pen passou a configurar uma alternativa credível para parte do eleitorado francês, cada vez mais cansado dos partidos tradicionais e desiludido com a anterior vitória de Macron, pois daí nada de novo adveio.

Na primeira volta, Macron obteve 27,6% dos votos e Le Pen 23%, sendo que Eric Zemmour que se apresentou como um candidato de extrema-direita, conseguiu 20%, e neste caso cativando os mais jovens.

Na realidade, a senhora Marine Le Pen, por mais que nos custe dizer, ocupou o espaço dos conservadores, transfigurando-se, e libertando-se do extremismo que ao longo dos anos marcou a família “Le Pen”, situação facilitada pelo aparecimento de um outro candidato mais extremista (Eric Zemmour).

Macron pretenderá um grande movimento de unidade nacional contra os riscos que Marine Le Pen poderá representar, mas já não será certo de que os franceses vejam na opositora do ainda Presidente, esses mesmos riscos, face à desilusão que foram os últimos anos em França.

No fundo, estão em discussão duas visões, não apenas da França, mas de igual modo da Europa e não é linear afirmar qual delas sairá vencedora, tanto mais que a Presidência do Conselho da União Europeia é atualmente exercida pelos franceses e assim continuará até Junho de 2022.

Depois, o conflito na Ucrânia e as suas consequências, não deixarão de estar em cima da mesa do debate que agora se avizinha, bastando a Le Pen afastar-se de Vladimir Putin para fazer esquecer que, durante anos, o seu Partido foi apoiado pelos rublos russos.

Para tal, deverá bastar-lhe dizer que não gosta de ex-espiões do KGB e sempre foi contra os Comunistas.

Não sabemos se isso bastará para o eleitorado francês, mas com o pouco que Macron tem feito pela Ucrânia, essa tarefa poderá ficar facilitada…

O projeto Europeu, depois de uma certa unidade em redor da guerra na Ucrânia, está outra vez em suspenso e tudo porque os franceses irão decidir quem ocupará o Palácio do Eliseu.