Longe pareciam ir os tempos em que a inflação atingia valores astronómicas de dois dígitos do lado das unidades, e todos nós já tínhamos esquecido esses tempos.
Mas pessoas há, que nunca chegaram a viver as conturbações desses tempos idos, o que significa que existem gerações de cidadãos que desconhecem, na realidade, o impacto da inflação nas suas vidas e no contexto em que estas se desenvolvem.
Habituámo-nos, com a moeda única, a viver sob a égide de um controle monetário que obrigou a fixar taxas de juro e níveis de inflação, tendo em vista a promoção e manutenção da política de moeda única.
O Euro foi, durante os últimos anos, o porto de abrigo contra a oscilação dos mercados e uma forma segura de gerir a crise das dívidas soberanas, beneficiando de uma taxa de inflação reduzida.
No entanto, tudo mudou e estamos perante uma inflação estrutural e já não conjuntural.
A inflação elevada veio para ficar, pelo menos nos próximos tempos, e com ela o aumento do preço dos produtos e a consequente perda de salários e, em resultado disso, a perda de poder de compra por parte de todos nós.
No entanto, nem todos ficam a perder, pelo menos no curto prazo!
O Estado, ao contrário de nós, e pelo menos nos primeiros meses do crescimento da inflação, vê a sua receita aumentar, nomeadamente por via dos impostos indiretos e “cegos”.
Se tudo aumenta de custos, os impostos que o Estado arrecada tendem, de igual modo, a crescer e sem que tal implique uma mexida das taxas aplicadas por essa mesma entidade.
Os cofres do Estado irão beneficiar, e estão a beneficiar, deste aumento galopante da inflação e que atingiu, em Portugal e no passado mês de Junho, 8,7%, valor mais alto desde Dezembro de 1992, tendo ultrapassando já a taxa de inflação da zona euro calculada em 8,6% para o mesmo mês.
Por exemplo, referir que ao nível dos custos com produtos energéticos estes aumentaram 31,7%, face aos 27,3% de Maio, e quanto aos produtos alimentares não transformados estes aumentaram 11,9%.
Embora o Estado possa arrecadar mais dinheiro à custa do crescimento do preço dos produtos, através de impostos como o IVA, e, numa primeira fase, tal possa significar um aumento da receita fiscal e, consequentemente, uma melhor saúde para a economia pública, no futuro isso trará repercussões gravosas.
Com efeito, se o dinheiro que o Estado agora recolhe como resultado do funcionamento da máquina fiscal, não regressar ao circuito da economia, significa que esta irá começar a derrapar de forma lenta mas inexoravelmente.
A retração na aquisição de bens e produtos será uma consequência, suscitando quebras de produção e, mais grave, a falência de empresas e setores.
O consumo interno não se vislumbra, com estes níveis de inflação, que possa continuar a ser o motor da economia, na medida em que níveis elevados de taxa de inflação correspondem a perda salarial e, nesse sentido, à perda de capacidade de compra.
Por outro lado, a solução nunca será o aumento salarial, por mais que nos custe ouvir, na medida em que esse aumento terá reflexos no custo dos produtos, entrando-se assim num ciclo vicioso que tende a dar maus resultados.
A solução implica o apoio às empresas ao reforço da sua internacionalização, regressando-se a um modelo que privilegia a exportação em detrimento do consumo interno, tendo em vista reequilibrar a balança comercial com o exterior.
Os fundos europeus, mais do que nunca, deverão ser canalizados para o investimento privado e público, desde que este último seja reprodutor de ganhos na economia nacional.
Infelizmente, aquilo que temos vindo a assistir é o Estado apropriar-se de todos os apoios comunitários para manter a sua própria máquina em funcionamento, aumentando toda a sua estrutura para níveis pré-bancarrota.
Esperam-se tempos difíceis e não será apenas culpa da Pandemia ou da Guerra, será também culpa da nossa incapacidade em mudar!
NUNO GOMES (Director de A COMARCA DE ARGANIL)