NOTA DA SEMANA: Alianças antigas não devem ser esquecidas

Em tempos conturbados como os que atualmente vivemos, os posicionamentos geoestratégicos são essenciais para a afirmação dos interesses de cada País, num mundo onde se vislumbra a vontade de alteração da ordem mundial, por parte das potências emergentes.

Talvez por isso, o estabelecimento de alianças entre povos seja uma forma de reforçar posições, tendo por base interesses comuns, mesmo que estes sejam de ocasião.

Os Estados Unidos da América (EUA), entendendo esta realidade, e talvez beneficiando dos receios que a invasão da Ucrânia suscitou, têm vindo a aprofundar, não apenas as alianças forjadas no pós Segunda Guerra Mundial e contra a então ameaça soviética, como a NATO, mas mais recentemente, tem procurado estabelecer/renovar alianças, nomeadamente na zona do indo-pacifico, tendo como principal objetivo travar o ascendente chinês.

Tendo em vista agilizar a celebração dessas alianças, ou mesmo ganhar rapidez na sua implementação, a aposta dos americanos tem passado por celebrar acordos bilaterais, com negociações diretas e rápidas, como foi a recente viragem das Filipinas e que dão mostras de um resfriamento na aproximação ao gigante vermelho, através da cedência de mais locais para o estacionamento de forças norte-americanas.

Essa mudança de atitude dos filipinos é claramente justificada pela questão da ilha Formosa (Tawain), e os receios da sua invasão com a consequente expansão dos interesses chineses para a disputa de águas territoriais das Filipinas, ricas em petróleo e gaz.

Também o exemplo da aliança entre a Austrália, Nova Zelândia e EUA, sem esquecer a aliança entre a Coreia do Sul, Japão e EUA, são exemplos da importância de uma estratégia de partilha de interesses comuns, e, muito especialmente, a defesa conjunta dos mesmos.

Assim, se hoje a diplomacia das grandes economias é feita sem esquecer a componente militar, e que durante as últimas décadas tinha deixado de ser priorizada como resultado da estabilidade na ordem mundial então existente, essa mesma diplomacia passou a assentar em alianças estratégicas de natureza económica, mas ao serviço dos planos de defesa militares.

É neste contexto que foram celebrados os 650 anos da aliança luso-britânica, resultante do Tratado de Londres, assinado em 16 de Junho de 1373, e que estabeleceu uma união de defesa e paz e que foi reafirmado em 1386 com o Tratado de Windsor e já depois da batalha de Aljubarrota que teve lugar em 14 de Agosto de 1385.

No entanto, podemos recuar no tempo e encontrar o ensaio dessa aliança em 10 de julho de 1372 com a celebração do Tratado de Tagilde, nome de uma Freguesia do Concelho de Vizela.

Importa pois, perante o atual contexto de incerteza e instabilidade mundial, em que se posicionam interesses contrários ao modelo de Democracia Ocidental, que Portugal não desperdice esta aliança anglo-portuguesa, não apenas por ser a mais antiga do mundo moderno, mas por representar uma mais-valia para a diplomacia nacional.

Bem sabemos que os Britânicos nem sempre foram de confiar, fazendo valer, a partir de certa altura da História dos dois países, o seu maior poder económico e militar, como foi no caso do famigerado Mapa Cor-de-rosa, em que a coroa Britânica se opôs à ligação territorial entre Angola e Moçambique, e cujo conflito diplomático foi um dos rastilhos para a implantação da República, tempos mais tarde em Portugal.

Ou mesmo o equilíbrio que a “raposa” António de Oliveira Salazar conseguiu fazer para que, mantendo Espanha fora do conflito bélico da II Guerra Mundial, forjou para Portugal uma neutralidade que não deixou de ser útil ao Reino Unido e aos aliados.

Essa neutralidade amiga, pois tendia muito mais para os Britânicos e Americanos do que alguns historiadores querem fazer crer, teve o seu retorno com o reconhecimento por parte dos aliados, após o conflito militar, através do apoio que veio a ser dado ao então regime de Salazar.

Sabemos hoje, que a aliança existente entre Portugueses e Britânicos foi, na história dos dois países, uma ferramenta fundamental em determinados momentos e poderá vir a tornar-se crucial perante os desafios que se afiguram no horizonte mais próximo.

Por outro lado, e perante um País que saiu da União Europeia, com o famoso “Brexit”, Portugal tem uma situação privilegiada e distinta que radica em razões históricos e culturais junto do Reino Unido, sendo essencial aprofundar essas ligações no futuro.

Portugal pode então, ser uma ponte entre a Europa e o Reino Unido, como poderá ainda, ser um aliado junto da potência nuclear que é o reino de Sua Majestade, agora Carlos III.

Espero que a falta de engenho pela não valorização de alguns quadrantes políticos nacionais da celebração desta aliança, não seja um sintoma da incompetência em pensar o futuro do País!

Precisamos de mais alianças, precisamos de retomar e reforçar a colaboração com África, onde o Sr. Putin tem cravado as suas garras e os fundamentalismos religiosos têm dilacerado populações que antes estiveram sob a égide do “Imperio Português”.

Um império que teve um papel na nossa História e que agora deveria servir de ponto de partida para o posicionamento internacional do nosso País, sem receios e sem problemas de consciência que todos os dias nos tentam impingir, mas em prol do reforço da portugalidade que radica, em primeira mão, na língua que é partilhada entre muitos desses povos.

NUNO GOMES (Director de A COMARCA DE ARGANIL)