
Com tempos conturbados no horizonte, os portugueses vão-se habituando, não apenas à instabilidade política, mas também à hipotética necessidade de a União Europeia reduzir o financiamento comunitário destinado aos fundos de coesão que foram criados para a convergência entre os Estados.
O parágrafo anterior parece retirado de um qualquer manual económico emitido por Bruxelas, e logo após mais uma reunião da Comissão Europeia.
Contudo, vou traduzir para um português percetível para todos e que passo então a exprimir: – meus caros amigos leitores apertem o cinto, porque o dinheiro da europa vai deixar de financiar as festas, a duplicação de obras, os pavilhões polidesportivos, as piscinas, os cantores dos festivais, a máquina pública, os projetos sociais que se atropelam uns aos outros, e tantas outras coisas que por aí vão proliferando e que pouco, ou nenhum, impacto têm na economia que realmente é produtiva.
Infelizmente, a economia que realmente é produtiva tem sido esquecida ao longo de décadas, ao ser colocada na dependência das remessas financeiras aprovadas pela burocracia do Parlamento Europeu, originando o desmantelamento sucessivo de toda a capacidade produtiva portuguesa.
Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão Europeia, com o beneplácito de António Costa, anunciou com pompa e circunstância o plano intitulado de “Rearmar a Europa”, e que será suportado na módica quantia de 800 mil milhões de euros, dos quais 150 mil milhões serão provenientes de empréstimos.
Anunciou ainda, que os limites ao deficit de cada País não deverão ser tidos em conta para a despesa militar, e que os 650 mil milhões em falta para que seja atingido o número mágico destinado a rearmar a Europa deverá vir, imagine-se, dos orçamentos nacionais de cada Estado!
Nós por cá, e depois de termos destruído toda a indústria de defesa, a começar por “Braço de Prata”, seguindo-se os estaleiros navais e mais umas poucas coisas que tínhamos como relíquia do antigo regime, iremos agora ter umas Forças Armadas que farão ver a Vladimir Putin e assustar Donald Trump.
Nós, os portugueses que desperdiçámos o ouro do Brasil, que aniquilámos a possibilidade de aceder aos maiores recursos naturais em África, que somos incapazes de ter uma Comunidade de Países de Língua oficial Portuguesa (CPLP) como espaço privilegiado e motor económico da lusofonia, e que vivemos as últimas três décadas dependentes do “ouro” da Europa, iremos agora arranjar dinheiro para comprar armas!
Nós, os portugueses que acabámos com o serviço militar obrigatório, que temos blindados parados nas oficinas do exército porque não há peças para estes, que vendemos parte dos F16 à Roménia, que temos Fragatas sem canhoeiras, e outros navios com tripulações que se rebelam porque têm medo de naufragar, vamos agora comprar o material de guerra mais sofisticado e evoluído tecnologicamente para estarmos na vanguarda do desígnio europeu.
Nós, os portugueses “europeizados” que deixámos os chineses invadir o nosso mercado com os seus produtos mais baratos, resultado da exploração laboral que o sistema comunista construiu e mantém, e dizimámos a nossa indústria por amor a “Che Guevara”, vamos agora construir um exército pleno de rapazes e raparigas dedicados à defesa da causa europeia e da integridade territorial da Ucrânia.
Nós, os portugueses finos, que construímos hotéis e transformámos o turismo na “galinha dos ovos de ouro” da nossa economia, ostentando com orgulho lusitano os prémios internacionais enquanto arranjávamos mão-de-obra barata imigrante, porque afinal todos nós gostamos de passar férias neste país de praias paradisíacas, vamos agora trabalhar na indústria militar, colocando pólvora nos cartuchos das armas que vamos vender.
Nós, os portugueses cultos, que defendemos a transição energética, a desativação das centrais a carvão, a construção de centrais fotovoltaicas de dimensões megalómanas, o desmantelamento das barragens hidroelétricas, a preservação das gravuras de Foz-Côa, e não permitimos a exploração de lítio (por sinal indispensável para os carros elétricos), mas vivemos paredes meias com centrais nucleares espanholas e importamos a energia delas, vamos agora oferecer os nossos filhos para defender o solo da pátria europeia, já que esquecemos a nossa.
Nós, os portugueses ecologistas que impedimos a exploração prospetiva de gaz natural e hidrocarbonetos na zona de influência marítima portuguesa, porque podiam ser vistas das praias algarvias as chaminés ou as plataformas petrolíferas, olhamos para o lado e temos essas chaminés e plataformas na zona de influência espanhola, mas vamos agora para as minas destas serranias escavar volfrâmio.
Agora, é bom que se diga, sem receio e tabus, que a Europa, e muito em particular os europeus, não querem cortar no seu famoso modelo de proteção social, e muito menos na sua qualidade de vida, conquistada, em grande medida, graças à poupança na defesa e na despesa militar, socorrendo-se dos americanos para evitar esses gastos.
E aqueles portugueses que gritavam que era preciso manter a indústria, apostar na capacidade produtiva do País, explorar os seus recursos naturais, especialmente quando se tem uma Zona Económica Exclusiva (Atlântico) tão vasta, e manter as Forças Armadas operacionais e capazes, eram apelidados de … “estúpidos”.
Mas também agora, aqueles que criticavam quem defendia a re-industrialização da Europa, a sua afirmação internacional, a sua autonomia energética sem por de lado, por preconceito, os combustíveis fosseis, e o excesso de regulamentação emanada de Bruxelas, são os primeiros a dizer “peguem em armas”!
Descobrimos que os burocratas de Bruxelas, começando pela Presidente da Comissão Europeia e o nosso caro concidadão António Costa, afinal são os primeiros a dizer “peguem em armas e preparem-se para a guerra”…por outras palavras é claro.
Gostava de saber se serão também os primeiros a dizer que é preciso reduzir a despesa pública na saúde e na proteção social para comprar as tais armas e aí sim, saberemos quem é que acredita realmente no projeto europeu!