Nos últimos dias temos ouvido a invocação da Ética Republicana a pretexto dos consecutivos casos de demissão no atual Governo, mas o que é realmente a Ética Republicana?
Talvez o que vier a dizer nas frases seguintes não seja consensual, e nem sempre aceite por muitos dos amigos leitores, mas estou certo que a reflexão não deixará de ser descabida e nem fará mal a ninguém.
Comecemos pois por questionar se, existindo uma Ética Republicana, não poderá existir uma Ética Monárquica, uma Ética Religiosa, uma Ética Militar, enfim, um sem número de dimensões da Ética que determinado grupo, ou ideologia, estabelece como um conjunto de princípios para se elevar e diferenciar perante os outros.
Mas quererá isso dizer que a Ética de cada um desses grupos é superior à Ética dos outros?
Vejamos então.
Num sistema político reconhecido como uma Monarquia Parlamentar, como é o caso do Reino Unido, existirá, certamente, uma Ética no desempenho de cargos públicos, e essa mesma Ética estará associada ao regime político vigente, falaremos então de uma Ética Monárquica.
Mas quererá isso dizer que os republicanos existentes no Reino Unido, e a sua Ética Republicana, terá menos valor do que a Ética dos monárquicos? Parece-me óbvio que não.
Na realidade, a Ética é uma só e resume-se a cada um de nós ser sério e honesto.
Assim, ser-se ético é ser-se sério, honesto, e já agora, ter-se a decência e a vergonha de não obter aproveitamento do lugar que se ocupa, retirando dele vantagens pessoais, sejam elas económicas, sociais e até de domínio perante os outros.
É também por isso que, quando ouvi alguns políticos invocarem a famosa Ética Republicana, tive um arrepio na espinha, pois nessa invocação perscrutei logo uma tentativa de superioridade moral que em nada abona a favor dessa mesma Ética. Esta deverá estar presente em toda a nossa Sociedade, independentemente das sensibilidades e ideologias de cada um de nós, na medida em que somos cidadãos que vivem em Democracia e sob um regime politico designado de República.
Mas de igual modo, deveria ser assim se, por qualquer outro motivo, vivêssemos sob a égide de um regime político diferente, como é o caso da Monarquia Parlamentar.
Por outro lado, não posso deixar de recordar que a Ética Republicana que Teófilo Braga apontava, talvez não seja hoje aquela que tem sido invocada!
Para o então Presidente da República (1915), Teófilo Braga, o Republicanismo é o governo da moralidade e da ordem, não sendo possível trazer à razão e à justiça a Monarquia, em face dos favorecimentos e preferências em que esse anterior regime estava sustentado.
Ora, como bem sabemos, todos estes casos que sucederam na atualidade estão envoltos naquilo que Teófilo Braga sempre condenou através da sua Ética Republicana Positiva, ou seja, o favorecimento e o abuso da coisa pública ou, pelo menos, o desvalorizar e desconsiderar essa mesma coisa pública que é de todos nós, para proveito ou ganho pessoal.
Por outro lado, vários políticos republicanos de tempos bem mais recentes, defendem que a sua relação com a política assenta na ética da Lei, reduzindo a Ética Republicana ao respeito pela Lei.
No entanto, sabemos bem que nem Teófilo Braga defendia apenas isso, nem a Ética se resume a isso, pois nem sempre o que é legal é ético, e nem sempre o que é ético corresponde ao respeito estrito da Lei.
A Ética tem uma vocação universal que vai além da moral e da Lei, radicando num conceito de não lesar os outros.
Talvez por isso, falar de Ética Republicana na atualidade, será reduzir a uma certa casta política o “dom” de definir o que é ético e o que não o é, restringindo apenas àqueles que se inserem nesse círculo politico, a bondade em serem Seres Humanos éticos, porque apenas respeitam a Lei.
Contudo, a Ética deve ser uma prática de todos nós, assente na defesa do bem comum e do respeito por todos, cabendo aos políticos gerir a causa pública com a responsabilidade de quem está a gerir o que é essencial aos outros.
Em suma, Ética não conhece fronteiras, ou regimes, pois ser-se ético é saber distinguir o certo do errado, e na realização dessa distinção optar por praticar o que é correto.
NUNO GOMES (Director de A COMARCA DE ARGANIL)