NOTA DA SEMANA: Jorge Sampaio, um Homem só nos momentos que fizeram a diferença

Foto: TVI

Nem todos têm a sorte de se depararem com momentos e instantes que definem o caráter de uma pessoa, e nem todos aqueles que se deparam com esses momentos estão à altura dos mesmos e da importância que estes têm para muitos daqueles que os rodeiam.

No entanto, e por mais difíceis que sejam esses momentos, todos aqueles que os têm são uns afortunados, pois na realidade é através destes que se faz a distinção entre os Homens e as Mulheres de coragem, daqueles que não a têm.

Foi assim ao longo da História da Humanidade, e assim continuará a ser, resumindo-se a um punhado todos aqueles que estão no lugar certo e à hora certa para a tomada das decisões que podem fazer a diferença.
Recentemente, assistimos às cerimónias fúnebres do antigo Presidente da República, o Dr. Jorge Sampaio, com as merecidas Honras de Estado, as quais diga-se, estiveram à altura da solenidade do ato, confirmando que estas ficarão para a posteridade com o simbolismo que se impõe.

A ocasião serviu também, para confirmar que aos símbolos compete uma função, e a quem os ostenta uma responsabilidade, e o que seria de nós enquanto Nação não termos os nossos símbolos e o significado destes?
Pena é, que uns quantos queiram desvalorizar “o Render da Guarda” e a importância desse gesto.

Jorge Sampaio, Homem emotivo, teve a sorte de ter tido alguns dos tais momentos que marcaram a diferença.

Dois deles foram: o seu papel na independência de Timor-Leste da penumbra do domínio Indonésio e que durante anos foi apadrinhada por muitas das potências ocidentais, e o outro foi o assumir-se como candidato à Câmara de Lisboa, ocupando, à data, o cargo de Secretário-Geral do Partido Socialista (PS).

Em relação à causa Timorense, não deixa de ser verdade de que não foi o único responsável pela independência de Timor-Leste, mas foi um dos que não calou a voz a nível internacional pela defesa dos direitos humanos nesse território longínquo, ocupando, durante essa luta, o mais alto cargo da República Portuguesa.

Na História recente do nosso País, se existe momento gravado a ouro no longo livro que ilustra a nossa existência, esse será, sem dúvida alguma, a vitória diplomática de um Governo, em uníssono com o Presidente da República da época, na pretensão do reconhecimento do direito à autodeterminação dos timorenses.

No outro momento, e quando era então Secretário-Geral do PS, Jorge Sampaio anunciou ser o candidato à Câmara de Lisboa, assumindo para si o risco de tentar ganhar uma autarquia nas mãos do PSD/CDS, correndo sozinho o risco de morte política em caso de derrota.

À data foi coisa inédita, e, ao mesmo tempo, veio a ser a decisão percursora da avalanche de candidatos a Presidentes de Câmara que já ocuparam lugares nos Governos, ou na Assembleia da República.

Contudo, e muito para além disso, ficou o acordo estabelecido com o Partido Comunista Português (PCP) e que foi o advento da “geringonça”, agora tão em voga no discurso do Primeiro-Ministro, António Costa.

Anos mais tarde, o ex-Primeiro-Ministro de Portugal, Aníbal Cavaco Silva, e que hoje ainda é o político a quem os Portugueses mais vitórias eleitorais concederam, defrontou Jorge Sampaio, nas Eleições Presidenciais, com a vitória do segundo.

Apesar da derrota de Aníbal Cavaco Silva, entre ambos ficou uma relação digna, apenas ao alcance dos verdadeiros Estadistas, tendo ambos caminhado, apesar de em campos ideológicos opostos, lado a lado durante várias dezenas de anos no panorama da política nacional.

O Homem austero junto do Homem emotivo, mas sempre com respeito mútuo. Em ambos os momentos que marcaram a vida política de Jorge Sampaio, entre tantos outros, destacou-se a coragem e o arrojo, acompanhados pela capacidade de, após as decisões tomadas em solidão, estabelecer pontes, o que lhe permitiu ganhar contra as expetativas dos que não tiveram idêntica coragem.

Jorge Sampaio, pela forma de estar na vida pública e nos cargos que ocupou, criou empatia e carinho junto dos Portugueses, mesmo daqueles que não pertenciam ao seu campo político e por isso mereceu a solenidade das Honras de Estado.

Termino com uma frase simbólica que tantos querem apagar e que Jorge Sampaio, com as cerimónias de Estado de que foi alvo, fez ressoar na mente daqueles que amam o seu País, independentemente da sua cor partidária – “Honrai a Pátria, que a Pátria vos contempla”.

NUNO GOMES (Director de A COMARCA DE ARGANIL)