NOTA DA SEMANA: Mais uma vez os Incêndios e as prioridades trocadas!

Wikimedia Commons

Ano após ano são gastos milhões de euros destinados ao combate do flagelo dos incêndios, distribuídos pela contratação de meios aéreos, a constituição das designadas Equipas de Intervenção Permanente (EIP), a aquisição de viaturas e diverso material de combate no terreno, e, talvez mais significativo, a tendência de municipalização das Associações de Bombeiros, desvirtuando a sua essência que radica no voluntariado.

Mas também o reforço da Força Especial de Proteção Civil (FEPC), sucedânea da Força Especial de Bombeiros, da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANPC), ou a criação da Unidade de Emergência Proteção e Socorro (UEPS) da Guarda Nacional Republicana e sucessora do Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) dessa mesma força de segurança, são exemplos do incremento do investimento na componente do combate aos fogos florestais.

Em bom rigor, sabemos hoje que essas verbas serão sempre insuficientes, e os resultados oscilam de ano para ano, seja na área ardida, ou seja na perda de vidas humanas.

E também em bom rigor, sabemos que o investimento realizado potencializa a economia e todas as empresas da fileira do combate aos incêndios, o que suscita, não raras vezes, suspeitas sobre eventuais interesses na ocorrência de incêndios.

No entanto, mesmo antes sequer de lançarmos as suspeitas do costume, importa perceber o cenário de fundo que antecede as épocas dos fogos florestais.

Analisando a história dos fogos em Portugal, e não sendo eu especialista na matéria, podemos identificar ciclos de dez anos, no fim dos quais ocorrem sempre grandes incêndios!

Será por coincidir com o tempo de crescimento da floresta e a acumulação da biomassa nas florestas? Talvez sim, ou talvez não, afinal não sou especialista nem o pretendo ser.

E será que a criação das faixas de gestão de combustíveis, e a obrigatoriedade da limpeza dos terrenos veio, ou não, potencializar os incêndios, face à alteração dos níveis de crescimento das espécies vegetais, implicando uma constante intervenção na manutenção das ditas faixas para controlar o crescimento mais intenso das mesmas?

No entanto, o que importa verdadeiramente recordar, é a lamentável perda de vidas humanas no combate aos incêndios florestais, algo que há 50 anos seria impensável, apesar das enormes limitações de meios e recursos nesse período, comparativamente com a atualidade.

O exemplo mais recente foi a perda humana de três bombeiros da Corporação de Vila Nova de Oliveirinha, para cujas famílias enlutadas, respetiva Associação e Câmara Municipal, não posso deixar de enviar as minhas condolências e solidariedade neste momento de dor.

Contudo, não podemos escamotear que o modelo de organização nacional do diapositivo de combate aos incêndios florestais e socorro foi centralizado e organizado. Os Municípios, por sua vez, passaram a ter planos de emergência e estão designados responsáveis concelhios pela proteção e socorro.

A responsabilidade máxima em cada um desses territórios comete ao Presidente da Câmara Municipal, podendo ter, ou não, um responsável operacional pelas operações de socorro na respetiva área de influência.

Simultaneamente, nunca assistimos a um nível tao elevado de profissionalização dos corpos de bombeiros, com a clara separação entre a componente operacional da componente diretiva das respetivas associações, já para não falar do crescente nível da formação de todos os envolvidos no combate aos incêndios.

Que falha então? Na realidade o que falha, com tantos especialistas e comentadores de fogos florestais, de estudiosos universitários que percebem mais de fogos do que o comum mortal, é tão só a falta de humildade para se perceber que o Portugal profundo e rural foi abandonado à sua sorte.

A floresta, anteriormente produtora e geradora de riqueza, deixou de ter essa componente e passou antes apenas a dar despesa ao pequeno proprietário que pouco já tem para sobreviver, quanto mais para mandar limpar o mato.

E o mato tem que ser limpo, e a floresta tratada.

Criticam-se as grandes papeleiras e diaboliza-se o eucalipto, pois o que os números nos dizem é que as propriedades sobre a gestão da industria papeleira, e onde é produzido o maldito eucalipto, não tende a arder e porquê?

Porque a rentabilidade obtida dessas explorações radica na prevenção e na adequada plantação com aceiros e acessos, bem como a necessária vigilância e limpeza.

Pois é meus amigos, só há quatro soluções para os incêndios florestais, mantendo-se o atual dispositivo de combate aos mesmos, e neste caso isso implica opções e prioridades na escolha dessas.

A primeira passa pela entrega da gestão do espaço florestal à indústria papeleira e com ela a aceitação da existência de enormes áreas de eucaliptal; a segunda implica que o Estado deve dar o exemplo e limpar todas as áreas sob a sua responsabilidade (incluindo os parques naturais) e aí plantando as espécies autóctones, nomeadamente de folha caduca; a terceira passa por criar nos territórios onde se concentram as maiores manchas florestais de centrais de biomassa, adquirindo os resíduos florestais resultantes da limpeza das matas e da floresta pelo preço justo.

Por último, e talvez a medida mais polémica e para a qual uma certa intelectualidade de imediato se levantará, implica colocar todos os presos, que estejam em condições físicas para isso, a cumprirem planos de reinserção social e cumprimento de penas, simplesmente, a limpar matas, especialmente as que são dos pequenos proprietários e que não possuem condições económicas para isso.

E atenção isso não implica uma desconsideração e desvalorização aos respetivos direitos, antes pelo contrário, deverá ser sempre entendido como uma forma de pagamento da dívida para com a Sociedade, a sua preparação no retorno à mesma, e, acima de tudo, a aquisição de alguns hábitos de trabalho.

Em alternativa, libertem por esse Portugal inteiro um milhão de cabras selvagens e deixem-nas vaguear alegremente. Talvez assim as matas sejam melhor limpas!

Para finalizar, não posso deixar de fazer uma nota de rodapé para que se perceba a diferença entre o Portugal real, profundo e abandonado e o Portugal pequeno, cosmopolita e com laivos de uma tendência moralista e pseudointelectual.

Enquanto em Tábua se chorava e acompanhava o funeral de três soldados da paz e que morreram por causa dos incêndios, já em Lisboa fazia-se uma marcha em memória de Amílcar Cabral! Está tudo dito em relação às prioridades para uma certa classe de políticos!