NOTA DA SEMANA: O Costa deu à costa

Depois de várias negociações entre as famílias políticas de maior representação no Parlamento Europeu, António Costa viu ser aprovado o seu nome para Presidente do Conselho, decisão tomada pelos representantes de cada Estado que integram a União Europeia em cimeira destinada a esse fim.

Apesar da escolha do nome português não ter merecido a unanimidade dos Países, recorde-se o voto contra da Primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, podemos afirmar que António Costa teve o consenso da generalidade dos Estados, incluindo a Hungria de Viktor Orbán – tendo valido bem a pena a paragem em Budapeste do então Primeiro-ministro português para assistir a uma partida de futebol ao lado do seu homólogo.

António Costa tomará posse como Presidente do Conselho Europeu em Dezembro de 2024, com um mandato de dois anos e meio, e terá pela frente enormes desafios, designadamente a guerra na Ucrânia, mas de igual modo a relação com o novo Presidente dos Estados Unidos da América, sem esquecer o dossier das “sanções” às importações chinesas e o alargamento da própria União Europeia, entre outros desafios.

Embora não seja um cargo executivo, ao contrário do que sucede com a Comissão Europeia, teremos que reconhecer que, não apenas o nosso País é prestigiado com esta escolha, como o lugar em causa se molda na perfeição ao negociador nato que é António Costa.

Contudo, e no momento em que esta crónica é redigida, sabe-se já da vitória na primeira volta das eleições francesas do partido de Marine Le Pen, o Rassemblement Nacional, herdeiro da Frente Nacional, com 33,2% dos votos, o que poderá representar uma viragem na política interna e externa da União Europeia.

Apesar de se aguardar pela segunda volta das eleições francesas, o que se sabe já é que os resultados obtidos representam uma ascensão estrutural da direita representada pela família Le Pen, num cenário em que o número de eleitores participantes foi muito significativo, atingindo 65,5% de participação, bem acima dos 47,5% registados nas eleições de 2022.

O eleitorado francês mobilizou-se, mantendo-se o candidato Jordan Bardella do Rassemblement Nacional e do Partido de Marine Le Pen, como a mais forte hipótese para liderar o Governo Francês.

Por seu turno, Jean-Luc Mélenchon, líder da coligação de esquerda, ficou em segundo lugar com 28,5% dos votos, relegando para terceiro plano o candidato de Emmanuel Macron, da coligação Ensemble e com 21%, o ainda primeiro-ministro, Gabriel Attal.

Seguramente António Costa, como hoje o conhecemos, já estará a preparar a estratégia para qualquer um dos cenários que resultar da segunda volta do escrutínio francês, pois se a extrema-direita poderá suscitar enormes constrangimentos à política externa da União Europeia, a opção da extrema-esquerda não é mais virtuosa.

E Jean-Luc Mélenchon não é seguramente flor que se cheire, pois representa um largo espetro da extrema-esquerda, cujo crescimento tem alicerçado, nos antípodas da política francesa, o partido de Marine Le Pen.

O cenário ideal será a manutenção da coligação de Emmanuel Macron como força dominante, através do apelo ao voto ao centro para evitar os extremismos de ambos os lados, tarefa que não se afigura nada fácil para o Presidente da República Francesa.

A escolha de António Costa para o lugar que este tanto almejava, poderá ter sido providencial, pois no horizonte desenham-se cenários onde as qualidades de promoção de pontes do antigo Primeiro-ministro, nomeadamente entre as esquerdas, conjugadas com a proximidade a Viktor Órban, do lado das extremas-direitas, poderão mitigar, eventualmente, os impulsos mais nacionalistas dos franceses.

Será caso para dizer que Costa, finalmente chegou à costa, depois de meses de contactos e reuniões onde, diga-se, o apoio do atual Governo liderado por Luís Montenegro foi essencial, valorizando a diplomacia nacional, em prol da projeção do nome do País e do estabelecimento de consensos entre os partidos do arco da governação.

Assim fosse noutras áreas…