NOTA DA SEMANA: O “insulto” aos Portugueses dos que não ouviram Zelensky

Foto: DR

Zelensky, Presidente Ucraniano, discursou na Assembleia da República antecedendo as comemorações do 25 de Abril, contribuindo, mesmo que não fosse esse o seu papel, ou vontade, para o reavivar do espírito da “revolução” dos cravos.

Num discurso não muito extenso, mas de apenas 15 minutos, fazendo recurso do apelo aos sentimentos e às emoções, colocou a tónica e o “dedo” na ferida da classe política Portuguesa.

Terminou o seu discurso com as referências a duas palavras do nosso rico dicionário da língua Portuguesa – Liberdade e Saudade – e, pelo meio, deixou bem claro que liderava um País democrático, invadido, agredido e atacado.

Não deixou ainda de ser pragmático, fazendo o apelo ao apoio de Portugal para que a pretensão da adesão da Ucrânia ao ”clube” da União Europeia mereça o respetivo apoio do executivo nacional.

Contudo, o discurso de Zelensky foi mais longe do que se poderia imaginar, ou mesmo sequer o próprio prever!

Zelensky obrigou, não apenas a classe política, mas antes a própria Sociedade Portuguesa, a refletirem sobre o 25 de Abril e o seu papel para a Democracia, alertando as consciências de muitos de nós.

Talvez tenha sido por isso que o Partido Comunista Português, PCP, não perdeu tempo a considerar um insulto ao 25 de Abril as referências feitas pelo Presidente Ucraniano a essa data no calendário Português, mesmo que não tenha estado no hemiciclo para ouvir, de viva voz, as palavras do líder Ucraniano, por sinal Judeu e com familiares assassinados às mãos de Nazis durante a Segunda Grande Guerra.

Poderia até ser um pormenor, mas, infelizmente, não o é, especialmente quando Vladimir Putin invoca a “desnazificação” da Ucrânia como um dos motivos para a invasão em curso.

O PCP, já o disse em diversas ocasiões, é um partido coerente, talvez o único no panorama político nacional, razão pela qual a sua postura em relação à guerra na Ucrânia seja a de optar pela condenação do Ocidente e a culpabilização das democracias europeias pelo conflito bélico em curso, em vez de condenar a agressão Rússia.

Mas essa é a sua coerência, pois sempre foi contra a presença de Portugal na NATO e na União Europeia, mas de igual modo, sempre foi a favor de uma ditadura Socialista em Portugal sob a esfera de influência da então União Soviética.

Talvez seja em nome dessa coerência, a mesma que Vladimir Putin invoca para invadir a Ucrânia, que o PCP não condena a Rússia por esse ato de guerra, traduzido numa invasão bárbara e em nome do sonho de restabelecer o território da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).

Mas Putin não é comunista, infelizmente para o PCP, é antes um pretendente a Czar, tendo na génese do seu poder o imperialismo da Coroa Russa, procurando, simultaneamente, recolher as virtudes económicas do capitalismo que alimenta os oligarcas do regime e o poder autocrático dessa mesma ditadura que lidera.

Posso então dizer que o PCP é coerente com a sua História, coerente com o seu passado e, agora mais do que nunca, coerente com os erros dessa mesma História.

Por isso, não posso deixar de dizer que o PCP nunca deixou de ser coerente com o que pensa da Democracia, nomeadamente de que esta era dispensável, desde logo porque não permite as ditaduras socialistas, embora possibilite que os comunistas possam existir e aspirar a essa ditadura.

No entanto, o efeito Zelensky não se ficou por aqui, permitiu colocar a nu a retórica do PCP, e já agora de uma certa esquerda portuguesa, por meio da qual se assumem como donos morais do 25 de Abril, cabendo-lhes apenas a eles interpretar a História e o significado dessa data.

Contudo, pela primeira vez desde alguns anos a esta parte, o 25 de Abril passou a ser visto como sendo um legado da Esquerda, da Direita e do Centro.

O 25 de Abril é de todos nós mas, acima de tudo, é da Democracia.
Talvez por isso o discurso de Zelensky tenha sido demasiado profundo, calando fundo no nosso íntimo, e quem foi insultado não foi o 25 de Abril, como o PCP quis fazer crer, mas antes os Portugueses que acreditam na Democracia pela ausência dos Comunistas na audição do discurso de um democrata atacado por um ditador.

Por último, o efeito Zelensky fez mais pela França do que os desastrosos anos de governação de Emmanuel Macron, ao assegurar que este fosse reeleito contra Marie Le Pen, conhecida simpatizante de Putin.

Até isso a Europa deve à Ucrânia, mesmo que por ela não tenha a coragem para empunhar as armas contra a Russia!

NUNO GOMES (Director de A COMARCA DE ARGANIL)