OPINIÃO: 25 de Abril (quase) sempre!

Já sei que o que irei escrever nas próximas linhas não será do agrado de uns quantos, especialmente quando falo das celebrações do 25 de Abril, envoltas que estão num cenário marcado pela epidemia do COVID-19.

De igual modo sei, que não devemos ser ingénuos sobre a recente polémica relativa à celebração desta data. Isto porque se uns invocam a situação de confinamento social que o País atravessa, para criticarem as referidas celebrações, outros haverá que, à boleia desta realidade, pouco lhes interessará a evocação dos “Heróis de Abril”.

Também não posso menosprezar o facto de que outros haverá que não gostam, e têm razões para isso, da apropriação que foi feita por alguns partidos de esquerda das celebrações desta data.

E porquê?

Porque não podemos esquecer de que, para alguns partidos políticos de esquerda, o 25 de Abril não era mais do que a “ponte” para uma ditadura comunista e que esta só não aconteceu porque existiram políticos como Mário Soares, Francisco Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa.

E aqui tão próximo de nós o Dr. Fernando Valle, médico humanista e fundador do Partido Socialista.

Ou porque militares, como o General Ramalho Eanes, puseram na ordem os seus colegas de armas que estavam ao serviço do bloco de leste.

Ou ainda, os terroristas das FP25 de Abril que mataram em prol de um ideário “proletário” para impor pelas armas, o que não conseguiram pelo exercício da democracia.

E nesse movimento militavam alguns dos que, agora de cravo ao peito, dizem ser pais da liberdade em Portugal…hipócritas.

Assim, existe na nossa Sociedade uma divisão clara sobre a forma como se encara a celebração do 25 de Abril.

Contudo, esta divisão não é de agora, nem é o resultado do isolamento social ou do COVID-19, antes pelo contrário, estes aspetos apenas permitiram justificar a existência desta divisão que está bem mais enraizada na nossa vivência do que poderíamos supor.

Embora a maioria da nossa Sociedade considere esta data fundamental na nossa História, não podemos deixar de salientar que, dentro desta maioria, nem todos estão satisfeitos pela forma como esta mesma data tem sido apropriada por uma minoria que se apresenta como sendo os defensores dos valores de Abril. Quando, na realidade, nem sempre o foram, e estão longe de o serem.

É por isso que a liberdade de expressão não pode funcionar apenas para alguns que partilham determinadas ideias. A liberdade de expressão, uma das maiores conquistas de Abril, é de todos e para todos.

Por esse motivo, não posso deixar de dizer que os feriados evocativos da nossa identidade não podem deixar de ser celebrados, de forma comedida, como é o caso, face ao cenário de Estado de Emergência imposto pelo COVID-19.

Por outro lado, verdade seja dita, a Assembleia da República não deixou de funcionar durante a epidemia, não só porque é um Órgão de Soberania, mas porque tinha que aprovar legislação relativa à situação do País e que não se podia compadecer com a suspensão da democracia.

Contudo, e se este foi um bom principio, outros órgãos e serviços do Estado o soubesse cumprir, não podemos, nem devemos, cair no exagero ideológico de uns pretensos arautos da verdade de Abril.

Que bom era que a tomada de posição por parte dos tais pretensos arautos dos valores de Abril, que mais não fazem do que apropriarem-se desta data, sem que para isso tenham qualquer mandato, ou moral, tivessem o mesmo empenho em defenderem as celebrações do 1.º de Dezembro, Dia da Restauração, ou o dia 10 de Junho, Dia de Camões, das Comunidades e de Portugal.

A nossa História é feita de vários momentos, ao longo de mais de quase nove séculos e, de igual modo, não podemos esquecer essas datas.

Caso contrário, não temos moral para defender os valores de Abril.

Que bom era que o Dia da Restauração, data simbólica em que nos libertámos do jugo espanhol, ser também defendido com o mesmo empenho pelos que defendem o 25 de Abril de forma tão veemente.

NUNO GOMES (Director de A COMARCA DE ARGANIL)