
No dia 7 de Maio, na Benfeita, voltaram a ouvir-se as 1620 badaladas da Torra da Paz – mandada construir por Mária Mathias – para assinalar os 80 anos sobre o fim da Segunda Guerra Mundial e, como disse na sessão solene pela Paz (a que presidiu) a Secretária de Estado da Defesa Nacional, Ana Isabel Xavier, “celebrar o fim da guerra aqui na Benfeita, tão próximo do Dia da Europa, é também recordar que a paz não é só a ausência de violência — é a presença activa de valores. Valores que partilhamos com os nossos parceiros europeus: a dignidade humana, a liberdade, a democracia, a igualdade, o Estado de Direito e os direitos humanos”.
“A Benfeita mostrou, há 80 anos, que até de uma pequena aldeia do interior pode despontar um som universal, um som que ecoa das ladeiras desta Serra e se espalha pelo país, pela Europa e pelo mundo – o som da Paz”, salientou ainda Ana Isabel Xavier, que com o Chefe do Estado Maior do Exército, general Mendes Ferrão, a representante da Comissão Europeia em Portugal, Sofia Moreira de Sousa, o embaixador Marcello Duarte Mathias (sobrinho de Mário Mathias), o presidente da Câmara Municipal de Arganil, Luís Paulo Costa, o presidente da ADXTUR – Agência para o Desenvolvimento das Aldeias do Xisto (e presidente da Câmara do Fundão, Paulo Fernandes, presidente da Junta de Freguesia da Benfeita, José Pinheiro, mais autarcas, pároco, padre Lucas Pio, representantes de colectividades e outros convidados. estiveram na pequena aldeia do concelho de Arganil para participar na Festa da Paz.
“Há 89 anos que se ouve a Paz na aldeia”, foi o tema desta Festa da Paz, “um evento ímpar no nosso país” que, 80 anos depois e “num tempo em que os ideais da paz voltam a ser desafiados à escala global” e que a Benfeita, o Município de Arganil e a Agência para o Desenvolvimento das Aldeias do Xisto quiseram recordar num programa e numa cerimónia que adquiriu ainda maior significado com o seminário “A Arte pela Paz”, referindo o presidente da Câmara Municipal de Arganil, Luís Paulo Costa, que “reunimo-nos hoje aqui, na Benfeita, para celebrar a paz, como temos vindo a dizer, para ouvir a paz. E foi há 80 anos. No dia 7 de Maio de 1945, terminava a 2.ª Guerra Mundial no Continente europeu. O silêncio das armas abriu espaço à reconstrução, ao reencontro entre povos, à promessa de que tamanha tragédia jamais se repetiria. E aqui neste particular foi mesmo uma promessa” ao recordar os conflitos que actualmente acontecem na Europa e no Mundo.
E depois de se referir à história da Torre da Paz, “mandada construir por Mário Mathias” e que desde há 80 anos, nos seus sinos, toca as 1620 badaladas, Luís Paulo Costa disse que “a sessão que hoje aqui fazemos pretende honrar esta memória” do fim da guerra, ao mesmo tempo que “queremos que o toque do sino que hoje aqui ouviremos seja um apelo, um lembrete, um hino à vida”, para dar a conhecer depois que “vamos iniciar, muito em breve, o processo para a classificação da Torre da Paz como Monumento de Interesse Municipal”, sem deixar de ter ainda palavras de apreço e de agradecimento para com todos os convidados presentes, em particular para com o embaixador Marcello Duarte Mathias,” muito obrigado pela sua presença. É um orgulho muito grande ter conseguido participar e da sua deslocação a esta terra, que também é a sua, e contamos consigo”, reconhecendo ainda que é membro de “uma família que efectivamente pode ajudar um território como este”, terminando por recordar que “já há uns tempos (…) andamos a falar, a pensar ou a refletir nesta intenção, nesta vontade de assinalarmos aqui, nesta Aldeia do Xisto, um evento relacionado com a temática da paz” e que agora se concretizou com “esta feliz circunstância, um número redondo, 80 anos, (…) para fazermos acontecer e para termos aqui hoje este momento que consideramos histórico, mas também muito importante”.
Momento histórico e importante que o presidente da Agência para o Desenvolvimento das Aldeias de Xisto, Paulo Fernandes, não deixou de exaltar também, agradecendo ao presidente da Câmara Municipal por “essa sua aposta, uma aposta muito importante em termos do que é a valorização de um lugar, (…) muito especial, a Aldeia do Xisto da Benfeita”, que tem na sua Torre da Paz “um valor patrimonial, um valor identitário, um valor de memória” e que “do ponto de vista dos intangíveis, é algo que provavelmente não tem valor, (…) é algo extraordinário”. E perante os conflitos que acontecem pelo Mundo, enalteceu os valores da tolerância e do humanismo e a necessidade de “nos unirmos mais institucionalmente à volta do contexto da paz, (…) a paz não engana”, terminando por salientar que “hoje é o primeiro dia de algo que vai ser, com a presença de todos, o que quisermos, uma semente forte”, deixando o apelo para “que todos possamos com esta semente que hoje aqui lançámos, poder nos próximos dias, próximos meses, próximos anos, continuar a regá-la, porque ela vai dar, seguramente, frutos, frutos muito diversos àquilo que é, no final do dia, o desenvolvimento de territórios como estes e ter um apelo pedagógico, de escala múltipla, relativamente a um valor tão importante como a paz”.
“É para mim um motivo de grande satisfação estar hoje aqui a celebrar os 80 anos do Torre da Paz”, começou por dizer o embaixador Marcello Duarte Mathias, considerando que “exprime, para muitos de nós, uma característica ímpar da terra da Benfeita, (…) caso único em Portugal”, para depois recordar o seu tio, as suas vivências na aldeia e a sua casa, “ali tudo era diferente” e, “por aqui se vê, que a minha Benfeita era e assumiu tudo para mim, bem mais do que uma mera recordação pessoal”, sendo por isso “de louvar que este encontro sobre a égide da paz, a missão que todos”, se realizasse na sua bonita aldeia.
A representante da Comissão Europeia em Portugal, Sofia Moreira de Sousa, começou por referir que “vou confessar que é a primeira vez que venho à Benfeita e pergunto-me porque é que demorei tanto tempo a vir visitar este sítio maravilhoso e carregado deste simbolismo”, para recordar depois os valores do tratado da União Europeia, actualmente ameaçados pelo que “acontece às nossas portas”, mas “embora estejamos perante uma crise de segurança, sabemos que foi e é na crise que a Europa sempre foi construída e é desta crise que resultará uma indispensável União Europeia da Defesa. Para que os sinos da Benfeita possam continuar a tocar por uma memória de algo que queremos que permaneça no passado e que sirva apenas para honrar a memória de todos quantos contribuíram para fazer da Europa aquilo que é hoje”.
“Estamos nesta aldeia da Benfeita, sede de freguesia, a festejar o evento perante o sino baptizado de Sino da Paz, adquirido por um filho desta terra, dr. Mário Mathias. (…) Obrigado dr. Mário Matias, por com a sua ação, com o seu desejo de paz, com a sua dedicação a esta terra, onde está sepultado a seu pedido, nos ter legado este património, que consta ser único no país”, disse o presidente da Assembleia Municipal de Arganil, António Cardoso, para salientar depois que “ao comemorar esta data e olhando para o que se passa no mundo nos dias de hoje, pensamos que é necessário continuar a lutar e a incentivar os dirigentes das nações em guerra, para que ponham fim às hostilidades, que dialoguem, que cheguem a entendimento e estabeleçam a paz, para que também nós possamos tocar o sino da paz nesta aldeia. (…) Há que agir e ter consciência que o mundo está muito perigoso, e que a todo momento podemos estar envolvidos, sem querer, no conflito”, terminando por enaltecer a família Mathias, “a Benfeita e o concelho de Arganil estão gratos e tenho muito respeito pelos homens desta terra que a dignificaram e trabalharam para bem de todos. Viva a paz e continuemos a lutar e a reclamar por ela no nosso dia-a-dia”.
O Chefe do Estado-Maior do Exército, general Eduardo Mendes Ferrão, referiu que “para falarmos de paz, temos de refletir num dos maiores flagelos da humanidade, a guerra, (…) uma realidade histórica e social que tem marcado a humanidade desde os primórdios” e a sua “característica mais imediata é, sem dúvida, a violência”, que se manifesta “não apenas na destruição física, mas também nas suas repercussões psicológicas e sociais, criando traumas que podem perdurar por gerações”, recordando os palcos onde aconteceu e está a acontecer, as marcas que deixou e que deixa, como há 80 anos e, para festejar o seu fim, “os sinos repicaram, aqui, nesta aldeia, em terras distantes, numa torre de igreja, tão singela como muitas outras num Portugal profundo e esquecido”, terminando por acentuar “que hoje, todos os anos, quando o Sino da Paz voltar a tocar com as suas 1.620 badaladas, possam lembrar as cicatrizes da guerra, homenagear os nossos heróis e celebrar a paz, (…) que depende do que conseguimos fazer de futuro com o que aprendemos no passado”.
“Educar para a paz é, mais do que nunca, uma missão essencial. É preparar os jovens para resistirem à desinformação, ao discurso do ódio, à banalização da violência. É contribuir para a sua formação como cidadãos portugueses e europeus, conscientes da sua dimensão humana, das suas capacidades e do seu papel na sociedade. Para que sejam construtores de pontes e não construtores de muros. E hoje deixo-vos por isso um desafio, passem esta mensagem. Falem com alguém sobre o que ouviram aqui. Nós vamos fazer o mesmo quando chegarmos a Lisboa. Se cada um de nós levar a paz no coração e na acção, o som da Torre Sineira continuará a ouvir-se, não apenas nas montanhas da Serra do Açor, mas em cada canto de Portugal, da Europa, em cada consciência humana”, disse a Secretária de Estado da Defesa Nacional , acrescentando que “na verdade, a paz tem de ser construída e, como qualquer construção, ela requer compromisso, colaboração e paciência”, terminando por saudar “todos aqueles que participam nesta iniciativa, mantendo viva a memória e projectando a paz como um valor do presente e não apenas uma recordação do passado” e com “votos de que o som das badaladas da Torre Sineira da Benfeita continue a ecoar sempre nas nossas consciências, salvaguardando a preservação da memória e da importância vital da paz, hoje como há 80 anos e também no futuro comum que continuamos a construir na Europa. Muito obrigada. Viva a Benfeita. Viva a Paz. Viva Portugal. Viva a Europa”.
Ouviu-se o Hino da Alegria pelos alunos do Polo de Arganil do Conservatório de Música de Coimbra, seguiu-se o “Ouvir a Paz com 1620 badaladas” e a inauguração do “Painel da Paz” representando a Geografia da Paz através da identificação de locais de culto e tratados de Paz; no dia 9, teve lugar um “Concerto pela Paz”, com Rui Massena, numa homenagem às vítimas dos conflitos e celebrando a esperança e, no domingo, dia 11, uma “Caminhada pela Paz”.