NOTA DA SEMANA: Camilo Castelo Branco, o romântico perdido

Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco, nascido em Lisboa no dia 16 de Março de 1825, veio a ser um dos mais importantes escritores do romantismo em Portugal, tendo sido o primeiro a viver da escrita.

E da arte da escrita que possuía, repartiu a sua vida entre a produção de obras literárias, tendo dado origem a mais de 260 obras, dos quais se destacaram “Amor de Perdição “ e “O crime do Padre Amaro”, no período compreendido entre 1851 e 1890, e a direção de vários jornais da época.

Apesar de nascido em Lisboa, as raízes da sua família aristocrata remontava a Vila Real no norte do País, para onde regressou com dez anos de idade tendo como destino a casa de uma sua tia, e após a morte prematura de seu pai.

Também cedo perdeu a mãe, contava apenas com dois anos, mas curiosamente a sua progenitora foi dada como incógnita (Jacinta Rosa do Espirito Santo Ferreira), cabendo ao seu pai, o aristocrata Manuel Joaquim Botelho Castelo Branco, perfilhá-lo em 1829, conjuntamente com o irmão, ambos filhos da mesma mãe “incógnita” com a qual nunca chegou a casar!

Depois de uma passagem por Vila Real, onde esteve na residência de sua tia no seio da família conhecida como “os brocas”, nada bem vista pelas elites dessa cidade, rumou, em 1839, para junto de sua irmã, Carolina Rita Botelho Castelo Branco, residente numa aldeia próxima conhecida por Vilarinho de Samardã, onde terá passado os maiores momentos de felicidade.

Nessa localidade recebe formação de dois padres, no entanto, perdendo-se por amores juvenis contrai matrimónio em 18 de agosto de 1841, com apenas dezasseis anos, unindo-se a Joaquina Pereira de França.

O casamento foi de pouca dura, entrando na Universidade onde coleciona amores e desamores, uma característica que se prolongará como uma marca por toda a sua vida, mas de igual modo uma fonte de inspiração para a sua obra literária.

Mas se a vida amorosa faz parte da sua natureza intrínseca, também a irreverência, o inconformismo e a sátira social, são uma presença constante no seu trajeto pessoal e profissional, aspetos que o levam a ter conflitos com diversas personalidades políticas da época.

Desses conflitos destaque para a “tareia” pública que levou do conhecido homem de mão do Governador Civil de Vila Real, o capanga “Olhos de Boi”, que não esteve para aturar as críticas e a superioridade intelectual de tão conhecido escritor.

 Camilo Castelo Branco dedicava-se não apenas a frequentar os bordéis, como também a conquistar tudo que usava saias, fossem casadas, solteiras, viúvas ou freiras. Igualmente dedicava o seu tempo aos saraus intelectuais da época onde trocava impressões com Alexandre Herculano e Almeida Garrett, apenas para citar os mais conhecidos na atualidade.

No entanto, foi o romance com Ana Plácido que figurará no imaginário romântico e da sociedade da época, perdurando até aos nossos dias, dando origem a uma das obras mais emblemáticas do escritor – “Amor de Perdição” – e por esse amor foi preso e julgado por adultério, conjuntamente com a sua musa.

Esteve preso um ano, conhecendo o famoso “Zé do Telhado” e escrevendo “Memórias do cárcere”, até que foi libertado, tal como a mulher por quem se apaixonou e com a qual teve três filhos, um deles gerado ainda durante a relação matrimonial que Ana Plácido tinha estabelecido em 1850 com o comerciante brasileiro, Manuel Pinheiro Alves, do qual se veio a divorciar.

Resultado dessa vida “destravada”, onde as mulheres ocupavam espaço central, contraiu sífilis e acabou por perder a visão, ficando irremediavelmente condicionado na produção literária e na capacidade de apreciar os prazeres da vida.

Manteve-se junto de Ana Plácido, com quem viveu o seu amor de perdição, e contraiu matrimónio apenas em 9 de março de 1888. Com ela partilhou os seus dias e os seus desesperos, até ao momento em que pede ajuda, por carta, a um dos maiores especialistas portugueses em oftalmologia, o Dr. Edmundo de Magalhães Machado, corria o ano de 1890, mais precisamente no mês de Maio.

O escritor não resistiu ao seu ímpeto suicidário, desprovido que estava da escrita e da capacidade de ver o mundo sobre o qual, laboriosamente, discorria o seu português magnifico e profundamente descritivo, como se de uma pintura se tratasse cada um dos seus textos.

No dia 1 de Junho de 1890, pelas quinze horas, aproveitando o momento em que o conhecido médico, acompanhado pela sua Ana, se dirigia à saída de casa, desfere um tiro de revólver na sua têmpora direita, não morrendo de imediato e agoniando durante algumas horas em coma.

Não passou desse dia, sucumbindo pela sua mão, mas deixando uma vasta obra que ilustra bem o romantismo em Portugal.

Com uma vida tão atribulada, Camilo Castelo Branco viveu na primeira pessoa as estórias que escreveu, só assim poderemos compreender os temas que abordou, como a orfandade, o adultério, o anticlericalismo, as heranças e morgadios, a fidelidade, os brasileiros, a família, e os bastardos. Todos estes temas estiveram presentes na sua vida, moldando a sua escrita e a sua sátira social, cujo maneio destemido e glorificador da língua portuguesa perdurarão pelos tempos…assim o queiram os responsáveis pelo ensino da nossa cultura literária.

Camilo nasceu fez duzentos anos, este é o ano do seu bicentenário.