NOTA DA SEMANA: França, o colosso que agonia e coloca em causa o projeto europeu

Ao longo do tempo, e desde que tenho o privilégio de assinar esta crónica, abordei, no âmbito do modelo de desenvolvimento europeu, a situação de risco para a segunda maior economia da Europa, neste caso a França.

As convulsões políticas que têm assolado esse País, mais não são do que o reflexo do distanciamento entre a classe política e o povo que, supostamente, deverá representar, com especial incidência nos últimos 40 anos.

Problemas como a imigração, ou a ausência de uma regulação mais conservadora no controle da entrada de cidadãos de outras nacionalidades que não do espaço da União Europeia, o incremento de um conjunto de direitos sociais sem a correspondente desenvoltura no campo económico, a incapacidade de alterações ao esquema de financiamento do modelo de proteção social, assim como a radicalização dos campos políticos, sejam eles de esquerda ou de direita, conduziram à ingovernabilidade da França.

Com uma dívida galopante, e a incapacidade para a realização de reformas, estamos perante a possibilidade de uma viragem definitiva da França para um dos extremos, seja ele de extrema-esquerda, seja ele de extrema-direita, e a culpa é exclusiva dos políticos que não tiveram nem a coragem para a realização de reformas ou, simplesmente, não foram capazes de dizerem a verdade ao seu povo.

É por isso que a França nos deve servir de exemplo do que não devemos fazer, agora que se aproxima de uma situação semelhante à que Portugal viveu no período da TROIKA, em que não havia dinheiro para pagar pensões e ordenados.

Em oito anos de governação de Emanuelle Macron, somam-se já sete primeiros-ministros, e todos eles sucumbiram à tentativa de parar o crescimento da dívida, que atinge já cerca de 115% do PIB, através da implementação de medidas mais drásticas de contenção da despesa pública.

O risco de colapso é realmente verdadeiro, especialmente num País que em 1980 tinha uma divida pública de pouco mais 20,70% do PIB!

Como resultado de cada uma dessas tentativas de controlo das contas públicas a França é bloqueada, especialmente pelas forças radicalizadas de uma esquerda que junta anárquicos, eurocéticos, ambientalistas radicais e contrários à NATO, liderados por Jean-Luc Mélenchon na sua França Insubmissa ou “La France Insoumice”.

À espreita está a “Reunião Nacional”, ou “Rassemblement National”, sucedânea da Frente Nacional, que vai capitalizando esses bloqueios e a eventual perda de regalias sociais, beneficiando do tal radicalismo sectário da extrema-esquerda. 

Na Europa, a extrema-direita cresce alimentada pela ineficiência de quem lidera, mas acima de tudo cresce porque adpta o seu discurso e os seus comportamentos a uma nova realidade social, apresentando-se como o porto seguro de uma cultura judaico-cristã que ainda é a matriz da construção das Nações europeias.

Ao longo dos últimos anos e no contexto do projeto europeu, assistimos à improvável saída do Reino Unido, algo impensável no tempo da dama de ferro, Margareth Thatcher, e que tão vilipendiada foi por uma certa casta política europeia, ao recrudescimento do investimento bélico na Alemanha, também algo impensável algumas décadas atrás, e ao aumento do perigo vindo de leste.

A Europa tornou-se dependente da energia russa e incapaz de liderar seja onde for, durante anos apregoou e incentivou o declínio do “império” americano, mas hoje percebe que a queda deste será o fim do projeto europeu, algo que é deveras paradoxal.

A Europa e o projeto da União Europeia cresceu sossegadamente à sombra da presença americana, e agora corre o risco de cair se esta presença sair, o que não deixa de ser caricato!

A França, na atualidade, representa todas as fragilidades de uma Europa enredada num discurso de direitos e liberdades, mas sem qualquer autoridade para os afirmar, dentro e fora de portas e muito menos para os sustentar.

Desta equação sobressai a Alemanha, que triplicou o seu investimento militar, regressou às centrais nucleares e prefere ir negociando com Donald Trump de forma, mais ou menos sorrateira, como aliás outros países europeus têm realizado, como são o caso da Itália, da Polónia, entre outros.

No campo das tarifas e taxas alfandegárias, anunciadas como o maior erro da administração americana, não se vislumbra que essa mesma administração não venha a ter razão, e isto porque a sua economia continua a crescer. Pelo contrário, a Europa reconheceu que estas eram um mal menor num cenário de instabilidade.

A França agonia e estende a sua enfermidade ao Reino de Espanha, que ainda vai beneficiando de um crescimento alimentado artificialmente pelo setor dos serviços, mas que vai trilhando, paulatinamente, idêntico trajeto francês…e os sinais estão todos lá.